Nós portugueses vivemos à quase um milénio neste pequeno rectângulo. Somos um povo antigo, com uma língua que sempre acarinhamos como algo poético e saudoso, tão parecida connosco com a personalidade dos seus sons.
A nossa pequenez levou a que, durante vários séculos de história, houvesse suficientes cruzamentos entre diferentes raças que cá viviam (mouros, godos, judeus, romanos, etc.) para que criássemos um precoce conceito de nacionalidade, dos primeiros na Europa e no mundo.
É muito difícil para nós analisar certos casos como o dos Balcãs. Não compreendemos a mescla de culturas, de etnias, de estatutos... Vemos, tal como a grande maioria das nações ocidentais, pelos olhos de um iluminista, de um revolucionário de 1848, o princípio de nacionalidade para nós é algo eterno e sempre presente.
Vou-vos falar aqui de 3 países. Da Sérvia, lar da nação de eslavos do sul mais famosa na história mundial, os sérvios. Do Kosovo (ainda não sei bem o que é) e de Timor. Três percepções diferentes de nacionalidade, quase desconhecidas para nós, europeus habituados ao preto no branco nacional.
A Sérvia foi durante largos anos um reino poderoso, que resistiu valorosamente à invasão turca, prevenindo assim a expansão do sultanato de Istambul pela Europa medieval e renascentista. A sua cultura é em muito semelhante à russa, devido à forte presença da religião ortodoxa e de ligações com a civilização bizantina grega. Daí a grande ligação que têm os sérvios, eslavos do sul, e os russos, eslavos do norte. Não confundir a concepção de eslavo com Eslováquia ou Eslovénia. Estes países, tal como a Croácia, a Sérvia, a Polónia ou a Rússia, são de etnia dominante eslava, mas as diferentes influências exteriores, devido ao grau básico civilizacional do primitivo povo eslavo, criaram diferenças entre estes, levando à criação de novas nações. Assim, a Polónia é um país de eslavos germanizados e católicos, devido à proximidade com a Alemanha e a Europa. A Macedónia, de eslavos muçulmanos que se cruzaram com antigos colonos turcos. Durante muito tempo, nenhum destes povos eslavos, à excepção da Polónia, atingiu um estado de independência ou mesmo de mínima auto-determinação. Os sérvios, os mais numerosos e com maior sentido de autonomia, sempre foram uma população problemática para as potências dominantes da região, a Áustria e a Turquia, aliando-se várias vezes aos Russos para as contrariar.
O Kosovo é actualmente habitado por sérvios, os originais habitantes da região, e por albaneses. Os albaneses são um povo anterior à vinda dos eslavos para os Balcãs. São de origem Ilírica, e eram nos tempos do império romano do Oriente contratados como mercenários, e criaram à custa disso um pequeno país que funcionava à custa de principados. Após a conquista turca, a Albânia recebeu várias influências deste povo. A antiga inimizade com os sérvios aumentou. Os Sérvios, que já viam os albaneses como um povo submisso aos turcos, e por isso seu inimigo, recrudesceram esta inimizade após a progressiva islamização da maioria da população albanesa.
Não existe, assim, uma população kosovare. Existe um pequeno território cuja população dominante não corresponde à nacionalidade do poder oficial. Mas a isto não podemos chamar uma situação ilegal ou injusta. Os albaneses do Kosovo saíram, na maioria, de livre vontade do seu território original, e foram instalar-se ali. O ódio dos Sérvios, que os viam como os capatazes dos antigos opressores turcos, levou a que essa população, cada vez mais numerosa, fosse dolorosamente discriminada. Os albaneses ripostaram com acções criminosas e aumentando o volume de comércio ilícito nas província, forma de comércio esse que é a actividade mais lucrativa do Kosovo actualmente. Milosevich, preocupado com a disseminação do povo albanês na província histórica do seu país, encetou uma política de limpeza étnical, prontamente julgada pela NATO e pelos EUA, que prontamente criaram infra-estruturas no Kosovo capazes de criar formas de limpar etnicamente os sérvios. Mas isto não passou, claro, na televisão.
A criação de um estado kosovare vai desequilibrar, mais uma vez, a situação nos Balcãs.
A sua criação só interessa ao governo americano, interessado na cruzada ideológica, e na formação de um estado potencialmente muçulmano e fácil de controlar, para amenizar as relações dos EUA com a religião de Maomé, e para ganhar um aliado na zona, de forma a contrariar as pretensões expansionistas de Moscovo e impor um travão na presença da política da UE.
E todos sabem disto. Sabem que o que se passa no Kosovo não é a libertação de uma nação, mas apenas a mudança de um estatuto e a criação de mais um país para o mesmo povo, o albanês. E sérias repercussões se podem esperar para os sérvios e os seus estimados monumentos localizados na zona, provas únicas da sua cultura. A Direita Europeia, americanizada e sem ideias, temente do que Sarkozy poderá pensar, não se mexe sem a autorização da França e da Alemanha. A Esquerda, fiel aos seus ideias de imutável e senil, sente-se obrigada, por um sentimento idiota de carácter pseudorevolucionário, a aceitar a criação de um novo país, algo tão belo de presenciar em todas as épocas, ainda que isso implique um feroz ataque à integridade da Sérvia. O mal deste país é a sua ligação com a Rússia e o facto de ser governado por um partido nacionalista. Assim, caso fosse outro, aposto que todas as organizações de lugares-comuns esquerdistas da treta que proliferam neste velha Europa, tão carente de quem a leve a sério, tão carente de uma esquerda interessada e investigadora, de uma direita activa e estável, fariam um mega-protesto.
Hoje de tarde vai-se criar um país sem estabilidade política, sem qualquer tipo de antecedentes históricos, do tipo de países que se criou com êxito na América do sul, mas sempre sem mérito na Europa. Vai-se criar um país dependente, sujeito aos embargos russo e sérvio, que não inspira confiança à Europa e aos europeus. Pior, um país totalmente sustentado com activos europeus, visto que os americanos, de tão bem que fizeram a sua missão, relegaram esta missão toda para a UE, que insiste em não dar o seu parecer àcerca do assunto. Um povo para dois países, ou seja, prevê-se uma união futura entre albaneses da Albânia e albaneses do Kosovo. Basicamente, retiramos uma fatia de território tão importante ao sérvios como é para nós o Minho, com a cidade de Braga e Guimarães, berços da nacionalidade, e vai-se dar de bandeja aos albaneses. Não vejo em que é que podemos sequer apreciar esta decisão.
Por fim, gostaria de resumir a situação de Timor leste. ou Lorosae, depende do dialecto que se falar, se em tétum, se na língua portuguesa. Antigamente dividida entre duas potências, Portugal e Holanda, a ilha de Timor mostra claros indícios das diferentes colonizações. Entre uma população numerosa e citadina do Timor Leste, ou cidades bem organizadas mas que se anda quilómetros para ver nativos da região a Oeste. Simplesmente os holandeses preferiam exterminar populações possivelmente nocivas a ter o nosso método desconfortável de conviver com elas. Um passo verdadeiramente interessante seria dar a independência à outra metade da ilha, para que, juntamente com Timor Leste, formarem um estado confederado tendo em base a comum cultura tétum, e as diferentes vertentes portuguesa e holandesa-indonésia dos respectivos estados.
Há dias ouvi nas notícias que, após o atentado a Xanana, se devia por a seguinte pergunta: "Quem estaria interessado na morte de Reinado?" ou seja, já se pensa que Xanana está, de certa forma, a eliminar os opositores ao poder. De facto, esta reaccionarice de jornalista sempre foi muito presente em Portugal, este recusar a admitir méritos a todos os que se mostram conscientes da necessidade de uma presença estrangeira neste país jovem. Xanana Gusmão é um homem muito respeitado na comunidade internacional. É um antigo combatente, e atraí as simpatias do seu povo. De originária ideologia socialista, ele é agora um presidente liberal e consciente das realidades do mundo moderno. Até a situação se regularizar, Timor vai ter ainda muitos anos de presença da ONU, e espero eu, de presença portuguesa, visto que podemos ainda e muito colaborar com este povo, e daí tiraremos muitas lições positivas e um aliado fiel. Admiro muito o povo timorense, e fico sempre comovido quando um timorense me fala com carinho do nosso país, da ideia persistente que eles têm do português.
Assim, contando com os muitos que estão interessados num presidente que não seja tão pró-português como Xanana, e que veja mais possibilidades de lucro com um líder mais submetido à vontade australiana ou americana, deve-se fazer antes esta pergunta:
Quem estaria interessado na morte de Xanana?
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