domingo, 3 de agosto de 2008

crónica do reino dos algarves (causas da queda desta província)

Depois de 15 dias de descanso nas praias da cidade de Albufeira, 15 dias de inutilidade, votadas ao descanso, à leitura, aos gelados e aos franguinhos da Guia, estou de volta ao meu caos familiar.
Não trago fotografias nem grandes lembranças. Fui acompanhar a minha mãe e irmãos numas férias bem merecidas, depois de um ano difícil mas bem vencido.
De facto, não aprecio muito o Algarve enquanto destino de turismo de praia. O Algarve é um sítio belíssimo, fantástico, se fugirem das praias.
Aconselho a todos uma visita a Silves, cujas muralhas guardaram, em tempos, uma das últimas grandes cidades islâmicas na Europa, do ponto de vista cultural e social e económico. Eu próprio já lá fui umas 2 vezes, e sempre encontrei coisas novas. Faro é uma cidade muito bonita também, onde se come bestialmente, se soubermos procurar e aguentar a morrinhice dos algarvios, os piores serventes de mesa à face da Terra.
Sagres é um grande montão de calhaus, e por muito que procurem a escola do Infante, o mais provável é ficarem com a sensação que aquilo não é porra nenhuma, e não passa de um pseudo-esquema para atrair turistas desejosos de uma mística de um Império que nunca existiu.
Castro-Marim, Vila Real de Sto. António, a própria Albufeira, a belíssima serra algarvia, se conseguirem ficar lá hospedados um dia para apreciar a flora única, são locais de visita obrigatórios e esquecidos do Algarve. Mas isso não vem nos panfletos.
De facto, o turismo do Algarve é uma valente merda.
Por muito que se tenha lutado contra os abusos descontrolados da urbanização descontrolada, o Algarve continua a perder a corrida contra a descaracterização cultural.
Depois de se tornar o pousio para a classe média baixa do norte da Europa, o Algarve procura elitizar-se antes de ficar com o nome manchado com o rótulo de destino turístico barato.
O Algarve sofre por estar cheio de algarvios, e esses algarvios não têm poder nenhum sobre a sua terra.
Tornou-se o Algarve numa espécie de Egipto dos tempos romanos, uma região portuguesa especialmente cuidada e tratada pelos Governos centrais. As cenas do Allgarve e todos os abusos consequentes vêm daí. O poder local, subserviente e dependente, é formado por uma classe de filhinhos da putinha, gente muito rasca, fruto de cruzamentos incessantes entre a população, mantendo aquela insuspeição mourisca e uma certa anti-portuguesice.
Esse poder local, que precisa de Lisboa, porque aprendeu, aquando da última crise económica que varreu o Algarve, que precisa de Lisboa para chamar os portugueses para o esforço patriótico de encher o hotéis e pensões algarvias, surpreendentemente abandonadas pelos cidadãos ingleses e alemães, fartos das crónicas subidas de preço. Agora, que tudo voltou ao normal, o Algarve já retomou o caminho, pensa-se.
Eu penso que não.
Se querem ser servidos rapidamente num restaurante, na área de Faro a Albufeira, procurem um restaurante brasileiro, chinês, ou cujos funcionários sejam morenos o suficiente para se ter a certeza que não são portugueses do Algarve. O único algarvio simpático, alegre, competente tanto na cozinha como na arte de bem receber, era um que havia nascido em Trás-os Montes.
A polícia algarvia é constituída por dois tipos de homens. O primeiro, homenzinhos pequeninos com barretes da GNR, serve para pedir indicações caso precisem saber onde é a praia. Caso queiram saber onde fica a rua onde se vende bugigangas para comprar para toda a gente lá em casa, eles já não conseguem. Não lhes pagam para isso, peço muita desculpa.
O outro tipo é formado por gorilas de boina, que vestem de fato-macaco preto, cuja única função é andar de um lado para o outro a falar numa língua desconhecida (o algarvio é, de facto, um dialecto) e que servem para nos escondermos atrás deles quando um inglês nos ameaçar com uma garrafa quebrada.
O comércio algarvio é em tudo igual ao do restante país, excepto na proporção. De facto, a qualidade dos produtos é duas vezes pior, e duas vezes mais caro. Abundam os senhores das tatuagens temporárias, os marroquinos dos bonecos luminosos, com cenas de néon na boca que os fazem parecer retardados a mastigar pirilampos, as pretinhas das tranças, adoro essas pretinhas, levaram-me 10 euros por uma merdice que puseram no cabelo da minha irmã, que eu próprio voltei a pôr quando aquilo se descolou. Há também os pretões dos óculos, senegaleses fundamentalistas, sendo que um deles chegou a amaldiçoar-me quando eu o mandei dar uma volta, irritado de negar a décima tentativa de negócio. A dada altura, oferecia-me a irmã e 30 camelos, se eu aceitasse comprar um par de óculos por 10 euros. Recusei, obviamente, por os óculos serem feios e por não ter espaço para pôr 30 camelos.

No centro de Albufeira, um senhor muito barbudo (estilo Karl Marx), apresentava num pequeno pavilhão patrocinado pela Câmara de Albufeira, com uma mensagem a dizer qualquer coisa contra a globalização (aquelas frases feitas) num painel de cartão forrado a latas de refrigerantes.
Como eu estava há vários dias sem discutir com o Francisco Noronha e a Daniela Ramalho, pessoas a quem eu gosto de chatear como o caralho, resolvi soltar umas boquinhas àquele Pai Natal dos sovietes.
"É a Globalização que lhe permite comprar todas essa latas de refrigerante" disse eu, e pensei, "fodi-o".
"Não, é a Globalização que me obriga a comprá-las" e pronto, agora fica tudo a pensar que o velhinho me encurralou. Eu acho simplesmente que o ancião podia muito bem ter comprado uma água Luso, em vez de gastar o dinheiro da Câmara para comprar Coca-Colas e Fantas. E depois, ainda fiquei arrependido de não lhe perguntar se não era a globalização que trazia todos aqueles turistas à sua cidade que lhe compravam todas aquelas pulseirinhas capitalistas que ele vendia à má rês a par da exposição. Pior, ainda foi o homem que me disse "Sabe ao certo o que é a globalização? Sabe o que é concretamente? É as empresas virem pra cá, comprarem tudo, e depois despedirem toda a gente".

É que o Algarve não sofre apenas de políticas governamentais estúpidas, de autarcas idiotas, de um turismo burro e dos turistas idiotas. O Algarve agora tem manifs anti-globalização.

3 comentários:

D. disse...

o algarve é de facto daqueles sítios que me dão cólicas... odeio o algarve, ou o allgarve. tudo aquilo que a sua costa significa...
quanto ao senhor de barbas, quando eu e o francisco formos idosos iremos fazer o mesmo por este país e depois vamos juntar as nossas caravanas e fazer uma mega digressão anti globalização... xD é engraçado notar que gostas tanto de nós que nem em férias nos esqueces.. muahaha

Ary disse...

=) Fantástico! Uma crónica com tudo o que uma crónica deve ter.

Anónimo disse...

Até concordo com algumas das coisas que aqui se diz.
No entanto vejo muitas incorrecções e permita-me dar-lhe uns conselhos para que nas suas próximas férias não saia tão frustrado:
1- Meu amigo, não venha só nos meses de verão quando está metade da população portuguesa cá e onde cidades que foram dimensionadas para os seus reais habitantes;
2 – Veja os folhetos dos postos de turismo do algarve e não os comercias de empresas (www.visitalgarve.pt)
3 – A “Escola de Sagres” é um mito e não uma estrutura em si (como quem diz, tendência, escola de determinado pintor, etc) , o que lá está é apenas a forticação da responsabilidade do IPPAR.
4 – Infelizmente tem razão quanto á desmesurada construção, muitas vezes construídos a mando dos grandes investidores no norte e de Lisboa.
5 – Quanto ao resto não encontro grandes diferenças para o resto deste pais pequenino e mesquinho que prefere criticar tudo em vez de tentar fazer melhor no seu cantinho.

Bem haja

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