segunda-feira, 6 de outubro de 2008

intervir ou não intervir

Texto de Maria João Marques, no Blogue Atlântico

Sim, a crise financeira foi provocada por demasiado tempo de taxas de juro do FED baixas e que constituíram um incentivo ao consumo e ao endividamento; sim, também existiram pressões políticas de várias administrações para que os Fannie Mae e Freddie Mac garantissem hipotecas a pessoas de baixos rendimentos e risco de crédito alto; portanto, sim, culpar o mercado apenas por erros que também são atribuíveis a outras veneráveis instituições é muito popular mas errado; sim, houve mau cálculo do risco de alguns produtos financeiros, houve predatory lenders e houve também falta de prudência de muitos que pediram créditos para comprar casas mais caras do que conseguiam pagar; sim, seria saudável que as instituições financeiras mal geridas falissem e fossem substituídas por outras mais viçosas e que quem comprou casas acima das suas possibilidades as devolvesse aos bancos e comprasse algo mais acessível ou arrendasse; sim, turbulência financeira e períodos de depressão económica são normais, descidas de quotações de acções são ajustamentos saudáveis e mal nenhum vem ao capitalismo por isso (pelo contrário); sim, intervenções estatais são sempre de desconfiar e geralmente trazem agendas de reforço da influência dos decisores políticos na actividade económica com inevitável consequência de menos eficiência nos mercados; sim, o mercado é a melhor forma de redução da pobreza inventada pelos humanos.

Contudo, o objectivo da actividade política é o bem comum e não a eficiência dos mercados (que sim, contribuem largamente para o primeiro). No caso concreto, os custos da crise financeira podem ser tão devastadores que se justifique uma suavização da crise patrocinada pelo Estado, mesmo que os custos, mais atenuados, sejam mais prolongados no tempo do que seriam caso não houvesse intervenção. Em casos excepcionais a intervenção do Estado pode não ser só legítima como aconselhável. Mas, dir-me-ão, isso criará a ideia de que as instituições finaceiras poderão correr todos os riscos e dispensarem-se de boa gestão porque sabem que o papá-Estado as vai socorrer in extremis. E têm toda a razão, e tal desresponsabilização poderá ser ainda mais prejudicial (ainda que eu não acredite que um gestor de topo não se incomode de ter no curriculum "quase levei o Banco X à bancarrota", e a melhor coisa que tem o mercado é que assenta na defesa pelos próprios dos interesses individuais), mas o que querem?, perfeito só o Reino de Deus.

Quer isto dizer que defendo com veemência o plano Paulson? Não. Acho que foi uma solução feita muito à pressa e outras medidas poderiam ter sido tomadas (a compra apenas das hipotecas, por exemplo, em vez de todo o "lixo tóxico"). Por outro lado, ainda não estou convencida que esta crise financeira venha a ser a mãe de todas as crises nem deposito grande confiança no catastrofismo dos líderes norte-americanos presentes e futuros. Eu não tenho informação suficiente e confesso-me espantada com as certezas que tanta gente revela sobre o que se deve ou não fazer. Têm tomado chá todos os dias com o Bernanke, ocasiões onde foram reveladas estatísticas e previsões desconhecidas dos mortais comuns?! Ou é tudo apenas convicção ideológica?

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