Há pouco mais de uma semana noticiou-se que cinquenta alunos ciganos (romani para ser mais preciso), em Barcelos, haviam sido isolados, em quarentena forçada, num barracão afastado das puras criancinhas não ciganas – livre-se a contaminação, cá não há misturas. Ora, não bastando, Margarida Moreira, directora da DREN (acrónimo para drenagem linfática), fez questão de afirmar que a questão está a ser zelosamente tratada, até é uma “discriminação positiva”. Descobriu-se, em seguida, que afinal há mais seis escolas em similar regime. Mas a trama segue, frame por frame, e a Comissão de Ética, Sociedade e Cultura, da Assembleia da República, refere num documento com mais de cinquenta páginas, que é aceitável a existência de turmas exclusivamente para crianças romani.
Bom, se tanta gente, gente com estudos, veja-se, concorda, então alguma valia hão-de ter. Vejamos tais premissas.
Ora, diz-nos Margarida Moreira, que os ciganinhos não têm com que se queixar, até estão a ser discriminados positivamente. Discriminação positiva significa uma situação de vantagem fundada, e como tal a fundamentação não se fez esperar, de todo o lado, de todos os pedagogos hippies que até justificariam o mau génio de Mussolini. Assim sendo, dizem-nos, as crianças romani têm muita dificuldade na aprendizagem, são pouco assíduas, quezilentas, e reprovam tantos anos que se torna incomportável a convivência com os meninos não ciganos mais novos. E há resultados, bradam, os pais ciganos estão contentes, os meninos agora aprendem muito melhor! Boas verdades nos fretam, senhores. Contudo, os odisseus são cavalheiros da mais pura água, difíceis de contentar, preocupados com subtilezas discursivas.
Agora a nossa refutação. Não duvidamos que os ciganos são uma dor de cabeça para alguns autarcas e restantes homens das lides políticas; o nosso propósito não é deambular pelos meandros da apropriação ilícita de terrenos nem do Rendimento Social de Inserção, não, vamos centrar-nos nas crianças.
Certo é não ser salutar a convivência de qualquer criança recém-chegada ao Ensino Básico com um jovem que já deveria frequentar o 3º Ciclo. Todavia, se o que se trata é de minorar o risco da convivência de crianças de idades tão díspares, se a idade é a razão de tal algazarra, não nos venham falar de crianças romani e não romani. Se o factor de instabilidade das turmas é a idade de certos alunos, se a convivência é insalubre de parte a parte então, estes alunos, os mais velhos, independentemente da etnia, seriam colocados em turmas separadas. Seriam colocados em turmas separadas em razão da idade, não da etnia, sublinhe-se.
Mais, se a razão das turmas separadas se prende não só com a idade mas com possíveis atrasos de aprendizagem, então, após sensíveis progressos dos meninos, estes seriam reconduzidos a turmas sem distinção étnica, terminando assim o apartheid. É sabido que isso dificilmente ocorrerá, em Portugal as turmas-piloto almejem outros voos.
Continuando, se as turmas-piloto se destinam a escoar alunos com dificuldade de aprendizagem ou com uma idade mais mais avançada, daqui resulta a inadmissibilidade da colocação de crianças ciganas recém-chegadas às escolas em tais turmas. Isto se considerarmos que uma criança não cigana e outra cigana, da mesma idade, na primeira classe, tem as mesmas capacidades – a DREN parece discordar. De facto, deve considerar, tal como Platão, que as crianças são distintas pelo metal que lhes corre nas veias (umas ouro, outras prata, e bronze para as ciganas); parece que a DREN reconhece uma incapacidade intrínseca a estas crianças, são naturalmente mais lentas. É aviltante pensar que uma criança, com tantas capacidades como qualquer outra e que até quer aprender (sim, há ciganos que não querem ser feirantes), vê tal possibilidade velada por uma turma que não lhe fornece os estímulos necessários, uma turma com um ensino “especial” que lhe ata os membros.
Acresce a todo este arrazoado grotesco que, para além de aulas em separado, estas turmas (em algumas das escolas) também possuem tempos de intervalo distintos, evitando contacto com outras crianças. Este facto talvez seja de mais sui generis justificação, custa a crer que o motivo seja uma qualquer coincidência na feitura dos horários. Porventura, neste pormenor esteja impregnada a motivação da escolha pedagógica – segregação pura e simples.
Como tal, tudo visto e ponderado, discordamos de Margarida Moreira – não estamos perante um caso de discriminação positiva, não estamos perante uma situação de vantagem fundada, aliás, estas crianças encontram-se sim numa situação de desvantagem inadmissível, o que representa, portanto, no nosso entender, uma violação do Principio da Igualdade (artigo 13º da Constituição da República Portuguesa), bem como do Direito à Educação (artigo 73º nº2 da CRP).
(por economia de espaço este artigo será rematado posteriormente)
Bom, se tanta gente, gente com estudos, veja-se, concorda, então alguma valia hão-de ter. Vejamos tais premissas.
Ora, diz-nos Margarida Moreira, que os ciganinhos não têm com que se queixar, até estão a ser discriminados positivamente. Discriminação positiva significa uma situação de vantagem fundada, e como tal a fundamentação não se fez esperar, de todo o lado, de todos os pedagogos hippies que até justificariam o mau génio de Mussolini. Assim sendo, dizem-nos, as crianças romani têm muita dificuldade na aprendizagem, são pouco assíduas, quezilentas, e reprovam tantos anos que se torna incomportável a convivência com os meninos não ciganos mais novos. E há resultados, bradam, os pais ciganos estão contentes, os meninos agora aprendem muito melhor! Boas verdades nos fretam, senhores. Contudo, os odisseus são cavalheiros da mais pura água, difíceis de contentar, preocupados com subtilezas discursivas.
Agora a nossa refutação. Não duvidamos que os ciganos são uma dor de cabeça para alguns autarcas e restantes homens das lides políticas; o nosso propósito não é deambular pelos meandros da apropriação ilícita de terrenos nem do Rendimento Social de Inserção, não, vamos centrar-nos nas crianças.
Certo é não ser salutar a convivência de qualquer criança recém-chegada ao Ensino Básico com um jovem que já deveria frequentar o 3º Ciclo. Todavia, se o que se trata é de minorar o risco da convivência de crianças de idades tão díspares, se a idade é a razão de tal algazarra, não nos venham falar de crianças romani e não romani. Se o factor de instabilidade das turmas é a idade de certos alunos, se a convivência é insalubre de parte a parte então, estes alunos, os mais velhos, independentemente da etnia, seriam colocados em turmas separadas. Seriam colocados em turmas separadas em razão da idade, não da etnia, sublinhe-se.
Mais, se a razão das turmas separadas se prende não só com a idade mas com possíveis atrasos de aprendizagem, então, após sensíveis progressos dos meninos, estes seriam reconduzidos a turmas sem distinção étnica, terminando assim o apartheid. É sabido que isso dificilmente ocorrerá, em Portugal as turmas-piloto almejem outros voos.
Continuando, se as turmas-piloto se destinam a escoar alunos com dificuldade de aprendizagem ou com uma idade mais mais avançada, daqui resulta a inadmissibilidade da colocação de crianças ciganas recém-chegadas às escolas em tais turmas. Isto se considerarmos que uma criança não cigana e outra cigana, da mesma idade, na primeira classe, tem as mesmas capacidades – a DREN parece discordar. De facto, deve considerar, tal como Platão, que as crianças são distintas pelo metal que lhes corre nas veias (umas ouro, outras prata, e bronze para as ciganas); parece que a DREN reconhece uma incapacidade intrínseca a estas crianças, são naturalmente mais lentas. É aviltante pensar que uma criança, com tantas capacidades como qualquer outra e que até quer aprender (sim, há ciganos que não querem ser feirantes), vê tal possibilidade velada por uma turma que não lhe fornece os estímulos necessários, uma turma com um ensino “especial” que lhe ata os membros.
Acresce a todo este arrazoado grotesco que, para além de aulas em separado, estas turmas (em algumas das escolas) também possuem tempos de intervalo distintos, evitando contacto com outras crianças. Este facto talvez seja de mais sui generis justificação, custa a crer que o motivo seja uma qualquer coincidência na feitura dos horários. Porventura, neste pormenor esteja impregnada a motivação da escolha pedagógica – segregação pura e simples.
Como tal, tudo visto e ponderado, discordamos de Margarida Moreira – não estamos perante um caso de discriminação positiva, não estamos perante uma situação de vantagem fundada, aliás, estas crianças encontram-se sim numa situação de desvantagem inadmissível, o que representa, portanto, no nosso entender, uma violação do Principio da Igualdade (artigo 13º da Constituição da República Portuguesa), bem como do Direito à Educação (artigo 73º nº2 da CRP).
(por economia de espaço este artigo será rematado posteriormente)
2 comentários:
Eu “gosto” do facto de elas estarem em barracões! Sinto que os valores humanos estão em vias de extinção.
Na minha opinião as crianças deviam desde cedo aprender a conviver com pessoas diferentes, se calhar o risco de se tornarem uns imbecis na idade adulta fosse bastante menor!
Não nego que turmas formadas crianças com uma diferença enorme de idades seja má para o desenvolvimento intelectual (e neste caso temos que olhar para ambos os lados). Mas esta questão dos ciganos versus pessoas normais aos olhinhos da DREN, enoja-me! Durante os meus 9 primeiros anos de escola (todo o ensino básico, mais propriamente) estive sempre nas “turmas dos repetentes”, e ninguém quis saber se isso iria afectar o meu desenvolvimento intelectual e humano (mas talvez esteja englobada na categoria dos “estudantes com mais com a formação mínima exigida no Estado Novo: 4 classe” o que fez com que fosse afectada por esta discriminação positiva)! Efectivamente fui muito prejudicada a nível intelectual, na medida em que ingressei no ensino secundário com bases péssimas. E olhando para a turma em si os resultados não foram muito bons: de 23 alunos, salvo erro, 3 foram para o ensino secundário; 2 para cursos profissionais; e os restantes, uns encontram-se a trabalhar, outros no fundo de desemprego, e alguns são pequenos criminosos! Porém, a nível pessoal, aprendi a dar mais valor às pessoas por aquilo que são. Aprendi a conviver com pessoas que tinham problemas reais que o mundo ignorava. E para mim essas pessoas valem muito mais um que um doutorzinho com canudo da DREN.
Por fim, se as crianças de etnia cigana conviverem com pessoas com de diferentes valores talvez queiram imitar o seu padrão de vida e, assim, alguns problemas sociais poderão ser resolvidos (este é/era um motivo para a construção de bairros sociais em áreas de residência das pessoas da classe média).
*"...estudantes com pais com a formação mínima..."
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