sexta-feira, 24 de abril de 2009

falar, democraticamente, sobre democracia

por Samuel de Paiva Pires

"Num auditório com cerca de um milhar de pessoas, perante o Professor Adriano Moreira, o ex-Presidente da República Mário Soares e Odete Santos, argumentei (tentei explicar, em vão, pois fui interrompido) que nunca houve fascismo em Portugal, ao que Odete Santos retorquiu com algo que não ouvi e que arrancou uma salva de palmas à plateia. A mesma plateia que não foi capaz de aplaudir como eu o fiz de pé o ex-Presidente da República quando em resposta à minha interpelação considerou que estando na academia, sendo nós estudantes de ciência política, temos que ter a noção que do ponto de vista dessa (e acrescento eu, do ponto de vistra estrito), não se pode dizer que o Estado Novo tenha sido fascista. Não deixa de ser irónico ter sido Mário Soares a compreender-me e fazer a minha defesa, para logo depois se divertir a colocar os dogmas de Odete Santos em cima da mesa, enquanto esta ia tentando mascarar as atrocidades cometidas pelo mundo fora em nome de uma ideologia - em minha opinião, um dos tipos de atitude mais indecente que se pode ter. Quando o pai da democracia em Portugal vai de encontro àquilo que os mais intelectualmente honestos sabem, que mais será necessário dizer? Aqui fica, mais uma vez, um aplauso e um agradecimento pela corajosa atitude que também o ex-Presidente da República teve ontem em nome do rigor científico."



"Agora, Salazar era tudo menos fascista, era um tradicionalista, conservador, integrista que pretendia manter a população calma, contrariamente à excitação que o fascismo advoga se provoque nas massas, e ainda que tenha utilizado instrumentos emprestados de regimes fascistas, como a censura e a repressão que, obviamente, porque sou um humanista, um liberal e politicamente incorrecto, me repugnam e repudio veementemente, foi o próprio Salazar quem reprimiu os que realmente eram fascistas, os nacionais-sindicalistas de Rolão Preto."

"The Estado Novo of Portugal differed from fascism even more profoundly than Franco’s Spain. Salazar was, in effect, the dictator of Portugal, but he preferred a passive public and a limited state where social power remained in the hands of the Church, the army, and the big landowners. Dr. Salazar actually suppressed an indigenous Portuguese fascist movement, National Syndicalism, accusing it of “exaltation” of youth, the cult of force through so-called direct action, the principle of superiority of state political power in social life, the propensity for organizing the masses behind a political leader” – not a bad description of fascism.” (p. 217)"

"Ora, na sociedade portuguesa criou-se o mito de que qualquer coisa que mexa à direita é automaticamente fascista. Seria o mesmo que eu ser intelectualmente desonesto e achar que tudo aquilo que mexe à esquerda é comunista, que é precisamente o outro totalitarismo do século XX que a par com o fascismo e nazismo vitimou milhões de pessoas, ideologias essas completamente incompatíveis com a prática da democracia liberal, da qual sou acérrimo defensor e simultaneamente crítico para com as imperfeições desta. E como há tempos me disse um professor meu, o espírito lusitano não é compatível nem com a prática do fascismo nem com a prática do comunismo real. Tentem implementar um regime assente em qualquer uma dessas ideologias e logo verão a reacção dos portugueses."

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