sábado, 13 de setembro de 2008

a terra prometida

texto de Jacob, editado no Há Discussão

Abafado, momentaneamente, este assunto delicado da ordem do dia israelita devido a uma recente vaga de infanticídios, Olmert pode recobrar o fôlego, nem que seja a custa de criancinhas afogadas pelos pais. Todavia, o actual primeiro-ministro há muito perdeu a serenidade à medida que as suas declarações caíam em saco-roto e os holofotes se voltavam para a sua ministra dos negócios estrangeiros, Tzipi Livni. Perante uma judia loira, de olhos azuis, e apoiada interna e externamente, Olmert bem tem de se conformar.
Veremos, então, se Tzipi Livni alcançara o poder, se tem coragem política para revitalizar Israel, coragem essa que será necessária se pretender atenuar a componente bélica da Terra Prometida; também se poderá dar o caso de não passar de mais uma burocrata, uma oportunista empenhada em enriquecer (a título de exemplo Ehud Barak, Benjamin Netanyahu e Olmert).

quinta-feira, 11 de setembro de 2008

esgotaram-se as palavras


Para falar de um dia que mudou, para sempre, o seu século. E talvez, toda a história da Humanidade.
Restam as imagens, e todas as opiniões que podemos tirar das causas e consequências dos trágicos acontecimentos desse dia.

terça-feira, 9 de setembro de 2008

quem sabe...

texto de Francisco Proença de Carvalho no Blogue Atlântico

A alternativa do PSD

“(A prioridade do PSD no plano económico) é reduzir a fiscalidade ligada à criação de emprego.” Manuela Ferreira Leite no discurso da Universidade de Verão.

Generalizou-se a opinião de que entre PS e PSD não há diferenças. A vox populi até diz que é tudo a mesma m….
Não tem que ser! Muito menos o PSD se pode convencer disso ou conformar-se com essa ideia.
É um facto! Há questões em que não têm que existir divergências entre os dois únicos partidos com capacidade e ambição de governar, como por exemplo, a segurança e a política externa. Mas há outras em que é fundamental que o PSD crie e explore essas diferenças. Só assim terá condições de ambicionar uma vitória eleitoral já no próximo ano.
Não obstante a coragem e espírito reformista do seu líder, o PS continua a ser um partido marcadamente estatizado (provavelmente para lamento de José Sócrates). As suas reformas estão quase sempre envoltas no intervencionismo do Estado. É assim na Saúde, na Educação e, em larga medida, na própria Economia. Ora, a única hipótese do PSD ser uma alternativa, é arriscar, é mostrar que as reformas podem ser feitas numa perspectiva diferente. O PSD de Ferreira Leite é o único partido com meios e capacidade para explicar aos Portugueses que políticas verdadeiramente liberais libertam o Estado para funções sociais, tão necessárias em momentos de crise. Infelizmente, o CDS não existe. Sobrevive entre tendências liberais e tendências democratas cristãs (o que quer que isso signifique) e está amarrado a um líder com mérito, mas que, por seu lado, também vive amarrado ao seu próprio passado.
Muitos perguntam (com razão): Face ao seu historial político, terá Manuela Ferreira Leite condições para protagonizar uma mudança liberal? Não seriam Passos Coelho e até Menezes mais liberais?
Talvez! No entanto, é preciso entender a Ministra Ferreira Leite à luz das circunstâncias em que exerceu a governação. O que fez e pensou no passado, não tem forçosamente que se repetir no presente. Neste momento, tem, pelo menos, uma grande vantagem em relação aos outros líderes: credibilidade. Ainda merece crédito e confiança dos Portugueses. Deveria aproveitar esses factores para marcar a diferença em relação ao PS. E essa diferença só pode ser liberal.
Haja esperança e coragem…

domingo, 7 de setembro de 2008

Sarah Palin - uma definição definitiva

Texto de Priscilla Santos
Imagem de Henrique Monteiro

Nascida em Idaho, Sarah Palin (/ˈpeɪlɪn/), 44 anos, é mãe, esposa atenciosa, técnica do time de basquete local e republicana não-alinhada. Sua indicação à vice presidência está para, entre outras praticidades, afastar a imagem de J. MacCain da do impopular governo Bush, figurando como elemento surpresa - e polêmico - capaz de dar novos ares a campanha do partido, que andava parecendo a programação do Bloomberg quando posta ao lado das aparições mtv-messiânicas de Barack Obama. Assim, sedutoramente tem lançando lânguidos olhares aos eleitores democratas, rancorosos com a derrota da senadora Clinton e sobre os indecisos a respeito do candidato democrata, tudo ao mesmo tempo que acena com propostas reformistas. Para tudo isso, usa sua principal arma: a posse de uma vagina. Surgem aí requentados os discursos feministas que iam meio apagados desde a separação das Spice Girls.

Não abandona a essência, de todo modo. Palin é conservadora até os ossos; procura se dizer uma cidadã comum, dona de casa comum, que adora sapatos de grandes estilistas comuns e que trabalha fora, como uma governadora comum. Por causa disso nos conta que conheceu o marido Todd na escola secundária (ele, campeão de corridas com carros de neve e operador de produção na anglo-persa BP Oil) e que tiveram cinco filhos. Patrioticamente, informa que o mais velho desde o ano passado serve ao exército americano no Iraque e, cristãmente, que o mais novo é um bebê com síndrome de down. Conclama assim suas três principais convicções numa estocada só: a família, a ocupação americana e sua posição anti-aborto. Sim, tudo oportunismo político, mas usa-se e resulta.

Vejam que os jornais anunciaram esta semana a gravidez de sua filha Bristol, de 17 anos, um bebê já com cinco meses: lá estava a família perfeita maculada... Um escândalo. Mas, como não existe marketing ruim, Sarah Palin foi a imprensa mais uma vez defender a vida doméstica norte-americana e angarriar novas simpatias; a filha nunca faria um aborto, os pais a apóiam de modo incondicional e a moça se casará com o pai da criança imediatamente. Ruim mesmo é só processo administrativo que corre contra ela por ter demitido o cunhado de um cargo público após este ter se divorciado de sua irmã.
É uma família animada e dela tem se feito um bom e velho uso pop típico dos republicanos, topam tudo por poder e disso não têm o menor pudor. A escolha de Palin têm surtido efeitos favoráveis não-imaginados, como se pôde ver no discurso de quarta-feira na Convenção Republicana, um recorde de audiência, mais assistido que a abertura das Olimpíadas de Pequin. Todavia os rivais prosseguem dando ênfase no que é inegável na beldade que é a sua inexperiência política. Corre à boca pequena que, se ela não conseguiu controlar a própria filha, como controlaria um país? E o que haveria de conservador em ser a mãe da Juno? Sarah Palin rebate: a diferença dela como mãe e um pit-bull é somente o batom. Por tudo isso e mais uns bocados é que, até novembro, os olhos, lentes, microfones e links do YouTube estarão atentos aos passos de MacCain-Palin para descobrir o desfecho dessa corrida à Casa Branca. Duo improvável, mas os republicano não são ingênuos e sabem que mesmo os amigos podem se converter em devoradores. Não se devem esquecer as situações extremas. Nem prever até quando as boas intenções e otimismos de Obama conterão a cultura do medo que se instaurou entre os norte-americanos desde aquele setembro.

no obvious

pede-se uma discussão vagarosa, pausada, e ampla

Aparentemente abri a caixa de Pandora dos textos sobre as presidenciais americanas.
No Sociedade de Debates, Pedro Ary escreve que "não podia discordar mais veemente" das coisas que eu digo, em relação a Palin e a Obama, no meu texto.
A primeira discordância, penso eu, reverte para as causas da aposta em Palin. A segunda, para o carácter da vice-presidência.
O discurso do Ary para criticar Palin é, como se pode ver com o mínimo de cuidado, baseado em pressupostos que foram adoptados por toda a opinião Democrata.
De facto, já ouvi todo o tipo de críticas a Sarah Palin, e gostava até de juntar um role de acusações à lista dos terríveis actos desta senhora, que pelos seus actos corresponde, obviamente, a uma Jack Estripadora:
Sarah Palin acredita que o Mundo se fez em 7 dias e vai fazer com que as pessoas reconheçam isso (aparentemente, não é bem assim)
Sarah Palin tem uma filha grávida, e é conservadora.
Sarah Palin acredita em Deus.
Sarah Palin levou McCain a ver o seu serviço Vista Alegre, ao que este respondeu muito admirado, "a senhora é mais rica do que eu".
Sarah Palin, escreve o Ary, é contra os preservativos (oh Deus, gosta de quecas ao ar livre e vai obrigar TODA a gente a fazer sexo da forma que ela quer).
Sarah Palin é a favor da abstinência, e tem cinco filhos, portanto pode ser que, ou ela se refira de abstinência de sexo antes do casamento, ou seja tudo uma grande treta da propaganda Democrata.
Sarah Palin fez alguma coisa ao gajos da MoveOn.org, visto que estes fazem uma data de acusações à senhora nos emails que mandam para todos os seus membros (entre os quais estão muitas das críticas apontadas pelo Ary, inclusive a tal ponte que não dá para lado nenhum).
Penso que, se a discussão eleitoral cair no mesmo jogo sujo que republicanos e democratas fazem, com as suas acusações mesquinhas e relegadas ao foro pessoal, não haverá discussão que se conseguirá manter. No entanto, penso que os que levam o estandarte Democrata avante, se em Portugal procurassem o mesmo sucesso com o mesmo esquema, não o iriam conseguir. De facto, todas as tentativas usadas por adversários políticos em Portugal para denegrir a imagem pessoal do rival passam despercebidas pelo povo português. Uma prova disso foi as campanhas do PS para atacar Francisco de Sá Carneiro por causa do seu relacionamento com Snu Abecassis terem acabado em complet insucesso. De facto, os portugueses vão mantendo um certo bom gosto que falta já ao público americano. E depois da novela de Sarkozy e Bruni, penso que é algo que também é partilhado por franceses.
Enquanto nos pudemos manter de vista clara e sem intrusões mediáticas podemos observar a realidade tal como ela é, sem filtragens do jornalismo americano. Sarah Palin tem, sem dúvida, mais provas dadas que Obama.
Obama pode muito bem ser advogado. E parabenizo-o por isso. Mas na verdade, nunca exerceu advocacia (ele orgulhou-se disso para atacar Hillary).
Para além de Senador do Estado do Illinois e dos EUA, Obama não tem mais experiência executiva ou legislativa. De facto, isto costuma ser a grande causa da derrota dos candidatos que foram senadores. E assim, em factos concretos, adicionando o facto de Obama ter sido Professor temporário, a experiência de Obama acaba por aqui.
O que Obama fez como senador é, por isso, a sua maior cartada. O Ary fala em legislação pela Saúde e medidas para baixar impostos e combater a corrupção. De facto, Sarah Palin fez isso tudo. E tem provas feitas no Alasca, que parece estar um sitio arrumadinho. Além do mais, a mulher reduziu o próprio salário e reduziu o imposto sobre a propriedade em 60%! A própria acusação contra Palin da sua extremosa religiosidade não vei muito longe, devido às intimidades que Obama partilhou com o Pastor Richards, o pastor mais racista da América.
Por isso, já vai tarde a demonização de Palin. Já vai tarde porque os republicanos não foram anjinhos e aprenderam a mexer-se. Ao lado da sacralizada figura de Obama, está uma Palin forte, cujos pontos de vista sobre a sua inexperiência estão todos comprovados como falaciosos. O que resta é o ataque pessoal. E é o que se tem feito, agora com menos intensidade porque a Obama interessa-lhe os votos das "hockey mom's" e com o andar dos seus apoiantes, arrisca-se a perder esta importante minoria.
Já expressei o meu ponto em relação a Palin antes, e não sou um apoiante. Mas como também não tenho simpatia por Obama no presente momento, não me parece justo ficar calado quando o Páis engole todo o tipo de patranhas vindas do lado de lá. Talvez me tenha tornado insensível à procura de heróis, mas nos dias que correm todo o cuidado é pouco, e os heróis dos tempos antigos não se revelavam em meses, eram antes homens normais e mortais, que estiveram lá quando a situação o exigiu. Obama é somente um candidato endeusado por um país necessitado de símbolos, de significado para as suas instituições. Isto deve-se talvez ao facto de as posições dos republicanos se terem extremado, e com eles a política local americana, e por os democratas se terem elitizado.

PS: Palin que se aconselha votar está aqui



textos relacionados:
Sobre a Loucura que se ouve do outro lado - Manuel Marques Rezende

Ela, de facto, desancou Obama - Manuel Marques Rezende

ela, de facto, desancou o obama

Como se pode ver neste vídeo aqui em baixo:


Palin suscitou na blogosfera de Direita uma reacção em cadeia, que me parece virada para um exagerado apoio. De facto, a blogosfera liberal ou conservadora faz aquilo que os partidos de Direita não fazem, porque não se sentem constrangidos a fazer: pronunciam-se sobre coisas.
Penso que grande parte deste novo chinfrim se deve ao artigo do Telegraph que compara Palin a Margaret Tatcher e a Ronald Reagan. Penso ser tudo muito exagerado. Por muito que Palin fale no governo reduzido, na descida de impostos, no combate às forças centralizadoras de Washington, não podemos esquecer, analisando o seu partido e o seu programa, que Sarah serve uma ideologia assente no conservadorismo, com um recente historial na expansão do governo, do comprometimento em guerras não-oficialmente declaradas e intermináveis, e em violações dos direitos individuais e humanos. Por muito bem intencionada que seja a senhora, o Partido Republicano parece-me o mesmo ninho de cobras de sempre.

ver textos relacionados:
no Atlântico - por Miguel Morgado
n'O Insurgente - por Bruno Garschagen
no 31 da Armada - por Henrique Burnay
no Diário de Notícias - por João Miguel Tavares

sobre a loucura que se ouve do outro lado

O Mundo, mais até do que os EUA, está agora a acompanhar com a máxima atenção a corrida vice-presidencial americana. A escolha de Obama foi, obviamente, discreta e passou quase despercebida, o que se entende, não iam os Democratas expor-se ao perigo de ter uma pessoa carismática que fosse ofuscar um pouco que fosse a luz do prestígio de Obama.
A escolha de McCain pareceu-me uma necessidade, um novo sopro para a campanha republicana, no esforço de contrapor os pesos da balança. Não penso que tenha sido uma escolha mal-feita, não no sentido de ter sido feita apenas com valor mediático em conta. Até pelo contrário, ao que parece Palin é uma mulher eficiente que tem feito algum bem no Alasca (e não Alaska, ouve aportuguesamento da palavra). Tenho pena que a carreira de Palin esteja, a meu ver, arruinada daqui para a frente. De facto, por muito que se pense que ela está na corrida a um dos maiores postos de Poder da Humanidade, o que lhe espera no futuro, ganhe ou não, é uma vida de submissão aos valores do Partido para sobreviver, visto que esta catapulta cedida por McCain levou-a directamente para o jogo dos Big Dogs, e aqui não há os privilégios e as liberdades da "pequena política".
Mesmo assim, insiste-se em fazer um espectáculo à volta de Sarah Palin. Procura-se saber quais são as competências dela, discutem-se as competências da senhora como nunca se discutiu as de Obama (que me parecem inferiores) e já se faz da corrida McCain-Obama uma corrida Obama-Palin. O que me parece, de facto, um grande espectáculo de deplorável mesquinhez. A comunidade blogueira em Portugal tem sido pródiga nesta discussão, sendo que entre os poucos locais que se mantiveram "limpos", a meu ver, desta discussão suja, foi o Sociedade de Debates, que eu faço parte enquanto autor e muitas vezes orador.
Também não vou ser eu a borrar a pintura. A situação deve ser exposta em poucas palavras. É Palin indicada para a vice-presidência? Claro. Até porque as funções do vice-presidente, no constitucionalismo americano, não estão assim tão claramente expostas como todos têm vindo a pensar. As responsabilidades do vice estão ligadas ao Senado, que no entanto tem passado muito bem, em pelo menos 18 ocasiões, sem vice-presidente. Quer me parecer que os americanos estão a discutir a quem querem pagar vários milhares de dólares por ano para fazer algo não muito bem definido e que só terá algum tipo de utilidade caso Obama ou McCain morram.
Não tivesse a política americana evoluído para um espectáculo milionário de democracia, e Democratas e Republicanos poderiam concluir que seria mais económico e mais inteligente não incluir um vice-presidente de todo.

Também publicado na Sociedade de Debates.

sábado, 6 de setembro de 2008

modern concepts of Property



o pão e o circo não fazem mal a ninguém. quem faz mal é quem o dá

O Tiago Ramalho, um dos autores do blogue Sociedade de Debates, tem vindo a deixar extensos e informativos textos sobre o estado da comunicação social em Portugal e no Mundo, muitos dos quais eu subscrevo totalmente. Subscrevo menos quando o Tiago insiste num diálogo à Daniel Oliveira, que eu já critiquei aqui, e que me parece contraproducente. De facto, tudo aquilo que aponto de verdadeiramente negativo no Quarto Poder é exactamente o facto de, afinal, não ser Poder coisa nenhuma.

"Após a proibição da transmissão duma tourada, em Junho, vem hoje a ERC declarar deliberar que as touradas podem ser transmitidas, porque não são má influência para as crianças.

Num país decente, o que não provoca alarme social poderia ser transmitido por quem quisesse como quisesse. Num país decente, caberia aos pais decidir o que é bom e o que é mau para os seus filhos, e controlar o comportamento de televisionamento da canalha, em consequência.

Cá não. Cá (não é só de Portugal que falo) têm que vir uns tecnocratas que ninguém sabe bem quem são, mas cuja apetência para o controlo comportamental é evidente, decidir.

Obrigadinho…"

sexta-feira, 5 de setembro de 2008

quinta-feira, 4 de setembro de 2008

o caos não é neutro! - parte II - entre a ciência e a política.

Modelo Social Europeu em Crise - Pedro Soares

O grande problema do Marxismo-Leninismo, enquanto ideologia, é fundamentar-se somente num livro e nunca numa experiência real. Apesar de contrário à doutrina socialista, e a todo o tipo de doutrinas não-individualistas, concordo sempre com o argumento esquerdista de que a experiência do socialismo e do comunismo nunca foram efectivamente realizadas. A grande razão está no facto de apesar de eu conseguir , eventualmente, desenhar uma vaca com asas, não querer dizer que eu algum dia hei-de ver uma. Muito provavelmente irei magoar umas poucas vacas pelo caminho, ao tentar incluir-lhes essas características aplicáveis só aos pássaros.
De facto, muitas pessoas parecem-se surpreender com o facto de o Marxismo-Leninismo ter sido, até agora, aplicado por regimes que acabam por desembocar em autoritarismos.
O problema, a meu ver, não está nos homens, ou melhor, não está apenas nos homens que são encarregues de construir os sistemas. Não creio que a situação na Rússia após a morte de Lenine tivesse melhorado ou transformado caso Estaline não tivesse derrubado Trotsky.
Não, o mal do Marxismo está no Livro. Quando alimentámos uma ideologia política apenas com uma fonte, ela deixa imediatamente de ser política. De facto, o Liberalismo, além de uma teoria económica com vários autores, é uma ideologia política inserida nas sociedades ocidentais que conheceu igualmente vários autores, alguns colocados à esquerda, outros à direita. O mesmo se passa com a Social-Democracia, que em alguns casos até vai beber inspiração ao prórpio Marx. Assim, o trunfo do capitalismo estará sempre na sua base empirista e plural. O socialismo, na sua inspiração Marxista-Leninista, está destinado a falhar porque não assume a pureza de uma ideologia política. E porquê? Porque quando se cria algo cuja fundamentação é uma teoria, uniformizada e não uma forma de vida ou filosofia colectiva ou comunitária, baseada em aspectos da antropologia humana, está-se a criar uma Ciência. E é isso que o Marxismo-Leninismo é. Não uma forma de política, mas uma Ciência. Porque não permite a transgressão dos seus princípios, e tal como as ciências, não é regida por opiniões individuais, mas sim por Leis científicas. Leis baseadas numa teoria e comprovadas de acordo com ela, e teorias baseadas em leis e comprovadas de acordo com elas.
Este é o cerne da questão, esta é a causa da falha do combate do socialismo contra o capitalismo. Não podemos esconder-nos sob a desculpa de que o socialismo nunca se cumpriu. Esta não é a sua maior desculpa. É antes a maior razão para o rejeitarmos.
O debate, introduzido pelo Professor Pedro Soares, foi a meu ver muito confuso, e conheceu uma fundamentação algo questionável.
Pedro Soares, reconhecido Marxista-Leninista, é no entanto uma pessoa de discurso fácil e de boa discussão, parece ser um bom professor, e é a prova de que os homens são mais do que aquilo que pensam, são aquilo que fazem ao ouvir o que os outros pensam.
A sua apresentação começa com um recuo histórico ao surgir do Wellfare State. A menção aos 30 anos gloriosos. No final da apresentação, eu e Pedro Soares concordámos que esses 30 anos Gloriosos tiveram um custo muito especial que mais tarde se iria notar, e de que maneira. O seu primeiro erro, no entanto, foi o facto de introduzir o Estado Providência como algo caído do céu. Faltou uma menção ao Plano Marshall, mas como é habitual aos europeus mandar à fava os americanos não me impressionei muito, temos uma comum tendência de nos esquecermos da ajuda deles. Acompanhando a exposição do Professor, chegámos ao fim dos 30 anos Gloriosos. Aí desenvolve-se outra falácia. De facto, os 30 Gloriosos parecem sucumbir à crise petrolífera dos anos 70 (1973 para ser mais preciso). Nada mais falso, nada mais comprovado ser falso. Interessa muito à doutrina socialista mais acirrada demonstrar a queda do capitalismo causada pelos seus pilares, ou seja, o mercado. Uma conturbação inesperada do mercado, como foi o caso da crise petrolífera, parece uma óbvia desculpa para derrotar as pretensões dos capitalistas quando afirma que conseguem manter um modelo de estado social com uma economia de mercado. Conseguiram assim os comunistas e os socialistas uma forma de dar uns bons safanões aos sociais-democratas naquela altura. Ora, a crise dos anos 70 começa antes do ano de 1973.
A contradição das teorias Keynesianas aparece quando surgem elevados níveis de desemprego, quebras nas produções industriais, e falências de empresas. Estes factos acontecem já, com alguma relevância, a partir de 1968. Não seria de estranhar mais uma possível controlada crise de recessão económica, não coexistissem na altura certas manifestações tradicionalmente irreconciliáveis: elevada inflação e consumo, ao mesmo tempo de uma quebra produtiva e desemprego. Nos EUA, em 1971, rebenta a crise monetária, a impossibilidade de converter dólares, devido ao esgotamento do crescimento europeu e japonês e ao falhanço das políticas de pleno-emprego. Assim exposto, com calminha e cabecinha, tudo fica a parecer muito menos Naomi Klein.
Passa assim o Professor para o chamado "neoliberalismo" que nem na altura era suportado pelos próprios liberais, pelo menos na generalidade. Um liberal não é apenas uma máquina de calcular, não é só uma teoria económica. Há mais em Friedman do que números. E se Reagan e Tatcher muitas vezes se sustentavam em políticas económicas baseadas em autores como Milton Friedman, eles não eram liberais, eram antes Conservadores, Tories, eram actualmente CDS-PP.
Após a diabolização de Tatcher, fala-se na queda do Sistema de Segurança Social na Grã-Bretanha, que ficou gravemente comprometido. Em defesa da pobre senhora, que está quase a bater a bota, eu resolvi intervir mais tarde para dizer que não foi só o Sistema de Segurança Social que caiu. Foi a própria produtividade. A indústria mineira britânica conheceu o seu grande rombo, após um coma expensivamente mantido. Criou-se no entanto as condições para um já reconhecido crescimento económico, que foi mantido nos governos posteriores. Por muito que culpemos Tatcher da crise, ela fez algo que a Europa faz agora, e que previne o Reino Unido de estar a passar o mau bocado que os Continentais, por cá, passam.
Mais tarde Pedro Soares apresenta um gráfico que continha números sobre o investimento público em vários países da UE. Assinalou as descidas "gravíssimas" de 0,3% na Suécia e na Irlanda, mas esqueceu-se das subidas de 7% em Portugal e no Reino Unido, bem como na restante grande maioria dos países europeus.
Concluindo, penso haver na Esquerda (radical ou revolucionária, como lhe queiram chamar) portuguesa vários preconceitos para com as estratégias económicas da actualidade. O perigo do "neoliberalismo" é difuso e parece encontrar-se em todo o lado. Tanto pode estar na política de mercado de Reagan como no corporativismo poderoso de Bush. A verdade é que as políticas económicas dos dois presidentes diferem e são, a meu ver, erróneamente comparadas.
O outro grande bicho está nas teorias económicas que envlvem aparelhos de Estado mais amplos e mais intervencionismo, mantendo a efectividade do sistema. A tal flexi-segurança, que tão bons resultados deu no Norte da Europa, parece-me também a mim um sistema difícil de adaptar por cá. Mas o medo há volta dele é injustificado. A partir do momento em que decorram maiores facilidades à economia de mercado e se criem capitais, tais políticas poderão ser seguidas por cá, à imagem do que os países escandinavos fizeram.
Não reconheço no Marxismo-Leninismo as capacidades de retirar o País da actual crise. De facto, este mesmo país já sofreu bastante com homens que insistiam em ler um só livro, seja ele o "Das Kapital" ou "A Bíblia". No caminho de uma sociedade plural e livre, os cidadãos terão a possibilidade de escolher, nas urnas de voto, entre uma política virada para o mercado ou uma mais colectivista ou colectivizadora.
O propósito Marxista de uso do Estado para reprodução e redistribuição de capitais, mantendo esta a sua função principal, é um fundamento caduco e utópico, que já demonstrou as suas graves consequências à Humanidade. É apenas uma novela a repetir-se por muitos e largos anos devido à atracção que impele ao imaginativo dos jovens, sedentos de um igualitarismo absoluto e um estado uniformizado.

quarta-feira, 3 de setembro de 2008

adeus céu azul



Agora que tenho 19 anos, vou-me dedicar a ser um pouco mais como este gajo, este, e estes.
E dedicar-me, definitivamente, a mandar este à merda.

hoje sinto-me assim


porque amanhã faço anos

segunda-feira, 1 de setembro de 2008

o caos não é neutro! - parte I - dogmas e verdades em homens de um só livro, no Socialismo 2008

Manipuladores Manipulados – Comunicação Social e Jornalistas (Daniel Oliveira)

Nada é verdade e Tudo é permitido. Estas foram as últimas palavras de um líder dos Ismaelitas (islâmicos) antes de morrer e ser levado para o Inferno, como diziam os seus inimigos que o acusavam de ser um líder de uma seita herética. Também é o título do livro de John Geiger sobre a vida de Brion Gysin. Este lema, antigo e inspirado nas velhas escolas filosóficas clássicas, não envolve apenas o caminho para a liberdade, caso assim fosse era apenas um lema anárquico, mas antes procura inspirar um caminho livre para a sapiência, o caminho para a análise independente e racional.
O Bloco de Esquerda conta, apesar da sua breve história de sucesso político, com um dos males que afectam os grandes partidos políticos e que mais se afasta destes princípios. A divinização de ideias e pessoas. Podemos dividir este pequeno partido numa hierarquia religiosa, sendo que as únicas mentes pensantes estão na chefia e por trás segue-se uma multidão prostrada e pronta a obedecer ao apelo das armas. Não só se batendo pela igualdade, o Socialismo 2008 consegue também que todos os seus frequentadores pensem igual ou com métodos semelhantes.
O dia 30 deste último mês, Sábado que passa, o Bloco fez um pequeno convívio na Faculdade de Psicologia da Universidade do Porto, frequentado pelas suas principais figuras, que consistia na apresentação de várias temáticas ligadas ao mundo actual, sendo que a maior parte delas eram apresentadas com o forte cunho ideológico do Bloco, como se esperava naturalmente num convívio deste tipo.
Interessado no alimento do espírito, eu, a Vânia Oliveira do ISSSP e vários alunos da FDUP, a Daniela Ramalho, a Sara Morgado, o Pedro Jacob e o Tiago Ramalho, combinámos ir juntos para assistir e tomar parte nos debates que aí se iam dar. Mal sabíamos nós que esse sábado ia ter muito pouco de debate.
O meu primeiro contacto com o Socialismo Bloquista (uma amálgama ideológica pouco firme, pouco sustentada, que se baseia em factos contornados de romantismo trotskista, marxista reformista, e outros -istas) deu-se, para meu prazer, com o Jornalista Daniel Oliveira, cujas crónicas eu vou acompanhando no Expresso com marcado interesse em ler uma pessoa muito convicta dos seus botões a falar não poucas vezes de coisas que parece perceber muito pouco.
Daniel Oliveira, do alto da sua moralidade bloquista, revoltava-se com as notícias da TV, o excesso da exposição da criminalidade. Mostravam-se uns números, uns vídeos que fizeram a alegria da multidão bloquista, formada de Patinhos-Feios muito seguros de si e pródigos em risadas de professor, como quem observava o desenrolar de uma sociedade constituída de pessoas que ainda não possuíam o mesmo nível intelectual que os frequentadores do Bloco, santificados ateus que têm, no entanto, a divina presença de ideias divinas.
Após a introdução de Daniel Oliveira, suficientemente grande para causar à assistência menos tendenciosa uma hemorragia nos ouvidos e suficientemente vazia para corresponder às expectativas dos bloquistas, abriu-se o espaço de participação da audiência.
Apesar de ter escrito uma página inteira de possíveis perguntas a Daniel Oliveira, sendo que uma delas era a famosa "E agora que disse isso tudo, qual é novidade?" ou então a menos conhecida "A sua apresentação é capaz de me ter causado um derrame cerebral, é capaz de chamar o 112?", notei que a assistência revelava-se igualmente interessada em debater o assunto, por isso resolvi fazer uma selecção de dúvidas. Qual foi o meu espanto quando vi que o mesmo cuidado não tiveram os bloquistas. As perguntas, com a sua natural complexidade, podiam ser todas resumidas numa única, que podia ser apresentada assim "Daniel Oliveira, pá, tu sabes que és o melhor (os bloquistas tratam-se todos por tu porque são todos pais do mesmo filho e filhos do mesmo pai, como nessas novas religiões americanas, aparentemente). Nós todos gostamos muito de ti, e eu queria perguntar-te se tu, sendo uma maravilha de um gajo e tendo essa barba muito socialista, és bestial ou só genial. (e agora vem a amostra intelectual que não pode faltar no discurso bloquista) Ah, e não te esqueças que o Caos não é Neutro!"
Após cada pergunta deste tipo, a sala silencia-se para ouvir a resposta de Daniel Oliveira, que resmunga qualquer coisa, ele próprio sem aparente paciência para os seus crentes.
Quando chegou a minha vez, temi de facto que o "Alarme Anti-Reaccionário" se activasse, e eu fosse ejectado da sala no preciso momento. Inocentemente perguntei ao Daniel se a imprensa não estaria só a reportar o aumento de criminalidade, que era inexistente de acordo com os números do Daniel, mas antes a violência exponencial dos crimes, que é de facto prevalente. Antes de acabar a minha pergunta já se tinha levantado o murmurinho na sala. O Alarme soara, um reaccionário encontrava-se entre as puras gentes do bloco, e fazia perguntas, a besta sádica!!!
Não posso incluir aqui a resposta do Daniel por várias razões: para além de uma resposta desmembrada e desarticulada, com a preciosa pérola do "Mas então porque é que eles não reportam a violência do Darfur, que também é valente?" (talvez por se passar a quilómetros daqui Daniel, e por cá haver problemas que cheguem, e ser uma coisa TOTALMENTE diferente) o Daniel fez questão de tentar me ridicularizar, quando eu referi a Geórgia no clube de nações oprimidas violentamente. Sim Daniel, é verdade que a Geórgia não é massacrada há tanto tempo como o Darfur. Mas convido-o a abrir a Wikipédia e ver a relação amistosa que este país manteve ao longo da história com o seu actual e amistoso ocupante.
O dia apresentava-se muito longo, e eu já estava algo desiludido. Não fosse a exposição sobre História do Mediterrâneo de Miguel Portas, ainda assim suficientemente tendenciosa, teria entrado em séria crise de melancolismo. De facto, fiquei a aprender poucas coisas sobre Daniel Oliveira, mas muito sobre o Bloco.
Sobre o Daniel, descobri que ao vivo a barba não lhe fica tão bem como nas fotos do Expresso. Além de uma justa defesa de Marco Fortes, pouco mais se pode indicar de positivo. Foi fraco, foi cliché. A TV, para ele, é uma maníaca-depressiva, que vive de euforia e repressão, e pressões. Os bloquistas queixam-se que a TV dá sempre a mesma coisa. Eu aconselho os bloquistas a deixar de ver TV, porque podem ficar ainda mais gordos e sebosos, e a pegar em bicicletas ou fazer amor. Os bloquistas não querem ver notícias de portáteis roubados em pleno tribunal, após o arrombamento de uma caixa multibanco ocorrido no mesmo. Os Bloquistas, e o Daniel Oliveira, sabem muito bem o que deve passar na TV. Só não nos dizem porque nós, comuns mortais, não íamos compreender. Deve passar aquilo que eles, e o Daniel Oliveira, muito bem entenderem. E só com a supervisão destes anjos mediáticos, se poderá atribuir notícias diferenciadas a cada estação, quer elas queiram quer não.
De facto não me impressionou reparar que as palavras mais usadas para solucionar o estado da nossa Televisão fossem estas duas pérolas: Denunciar e Controlar.
Estava à espera de mais deste debate com Daniel Oliveira na mesa. Marcado de um discurso dramático, excessivamente esquerdista, pseudo-revolucionário, manteve acima de tudo, acima da racionalidade e do poder da argumentação, o desejo de parecer um rapazinho traquina. E foi missão cumprida.

sexta-feira, 29 de agosto de 2008

no Brasil como em Portugal


Apesar de se definirem pelo seu contrário, como na foto do post abaixo, os jovens socialistas brasileiros conhecem o fascismo mais como xingamento do que como teoria. Não duvido que muitos deles se identificariam com o fascismo caso sua literatura fosse apresentada sob outro nome. Preparando o solo europeu para receber os cadáveres de milhões, Mussolini escreveu em La dottrina del fascismo:

Anti-individualista, a concepção fascista é pelo Estado; e é pelo indivíduo enquanto este coincide com o Estado, consciência e vontade universal do homem em sua existência histórica. É contra o liberalismo clássico, que surge da necessidade de reagir contra o absolutismo e exauriu sua função histórica quando o Estado se transformou nessa mesma personificação da consciência e da vontade popular. O liberalismo negava o Estado em nome do indivíduo particular. O fascismo reafirma o Estado como a realidade verdadeira do indivíduo. E se a liberdade deve ser o atributo do homem real e não desse fantoche abstrato pensado pelo liberalismo individualista, então o fascismo é pela liberdade. Pela única liberdade que tem um valor sério: a liberdade do Estado e do indivíduo dentro do Estado.

Não é esse mesmo individualismo liberal que Che Guevara combatia?: “O individualismo, na forma da ação individual de uma pessoa solitária no meio social, deve desaparecer em Cuba. No futuro, o individualismo deve ser a utilização eficiente de todo o indivíduo para o benefício absoluto da coletividade”.

E enquanto Mussolini se opõe ao “socialismo que interpreta o movimento histórico como a luta de classes e ignora a unidade do Estado no qual a classe se funde em uma única realidade econômica e moral”, ele entende que o fascismo consegue atualizar as aspirações socialistas no Estado:

“Dentro da órbita do Estado, o fascismo reconhece a verdadeira exigência que dá origem ao movimento socialista e sindicalista e os faz valer no sistema corporativo dentro do qual os interesses se conciliam na unidade do Estado”.

Nesse sentido, é muito apropriado chamar o fascismo de nacional-socialismo. Meu medo é que muitos jovens brasileiros já sejam fascistas sem perceber.

in Ordem Livre

quinta-feira, 28 de agosto de 2008

a paz armada


Após a queda do muro de Berlim, mais uma ameaça caminha para perturbar a paz europeia, e mais uma vez ela aproxima-se vinda de Oriente. Ao longo da história da civilização ocidental, vários têm sido os perigos que muitas vezes levaram a uma calamidade total. Invasões, epidemias, massacres. O rápido crescimento da civilização ocidental deu-se, em grande parte, devido a estas catástrofes. A expansão ultramarina, o conceito de democracia, de estado de direito, o progresso industrial e bélico, formaram-se todos na necessidade de se defenderem e ripostar contra um oriente que tantas vezes o entusiasmava e tantas vezes o amedrontava.
Assim, cedo começou a formar-se um equilíbrio difícil entre as potências ocidentais, principalmente europeias, de forma a ver qual delas era a mais poderosa e maior representante dessa mesma civilização.O século XX viu o delicado equilíbrio de forças desaparecer, e assistiu a uma guerra anunciada que traria a destruição de toda a Humanidade, não fosse a mesma cultura da ocidentalidade, a sua maior força, a deter a ameaça do comunismo e da sociedade totalitária.
Hoje, no século XXI, o perigo afigurou-se ultrapassado, e os esforços para preservar a liberdade externa tão carinhosamente preservada pelos nossos antecessores não foram revigorados.
Tudo indica que o século XXI será o século dos autoritarismos, tanto pela herança do século anterior, como pela necessidade que surgirá dentro das sociedades ocidentais e ocidentalizadas em combater esse mesmo perigo.Forma-se agora, a leste, uma situação que lembra a europa do Imperialismo alemão, a Europa da ameaça prussiana.
Estamos perante uma paz armada, entre democracias temerosas e ditaduras fortalecidas pelo jogo diplomático.

ambiguidade internacional

"Muchos estados se solidarizaron con el Tíbet desde la invasión china. India acogió a la mayor parte de los emigrados y ofreció tierras para construir monasterios e establecer la nueva sede del Dalai Lama. Varios países europeos, Australia y Japón abrieron oficinas para alojar representaciones del Gobierno Tibetano en el Exílio. Nepal y Estados Unidos incluso apoyaron a la resistencia local con armas, entrenamiento y servicios de inteligencia. Sin embargo, ningún estado ha reconocido al Gobierno Tibetano en el Exílio. En cambio, todos han ratificado la soberanía china."

in Historia y Vida, nº481

domingo, 24 de agosto de 2008

o seio repleto

ao meu colega Ary F. Cunha, adversário e aliado de tantos debates, professor em part-time, em resposta ao seu texto publicado no blogue da Sociedade de Debates

No Brasil, o Presidente Lula da Silvas criou uma bolsa família especialmente destinada aos habitantes do Nordeste, cujo PIB per capita era somente 28% do equivalente ao Sudoeste.
O Programa foi desempenhado com sucesso, gerando uma descida nos índices de miséria do povo brasileiro daquelas partes.
Tomado como exemplo por parte de alguns analistas económicos nova-iorquinos, e mesmo por parte da ONU, o Bolsa Família tem alguns condicionalismo relevantes que são, na sua maioria, relegados para segundo plano.
De facto, proporcionam às zonas "esquecidas" do Brasil um rendimento extra, fundamental para que haja algum desenvolvimento na área. O problema é que esse desenvolvimento é pago com o trabalho da restante população brasileira que, a meu ver, não tem passado tão bem nas duas últimas décadas.
Estes condicionalismos não estão a ser fiscalizados pelo governo convenientemente, apesar dos esforços federais em manter bem investido o seu dinheiro, vigiando os cidadãos com satélites e métodos afins, considerados igualmente de exemplares.

"Quando se usa um cartão de crédito, a empresa responsável é comunicada sobre o quanto deve pagar ao comércio por um sistema que utiliza linha telefônica. Em locais sem essa estrutura, a comunicação pode ser feita via satélite ou rádio", afirma Nina Farnese, técnica do projeto pela Caixa Econômica Federal, uma das entidades que faz parte do acordo de cooperação técnica assinado entre os dois países. - in Terra Magazine.

Assim, o Bolsa Família tornou-se, como era de prever, no rendimento per se dos nordestinos mais pobres. A educação não aumentou o que se esperava, apesar de o número de faltas às aulas ter diminuído o rendimento escolar continua nas ruas da amargura, e o dinheiro não serviu de incentivo para novas oportunidades, criando-se mais uma epidemia de "subsídio dependência".
Portanto, qual é a grande diferença entre o nordestino antes do subsídio, e este nordestino engordado pelo subsídio?
É que dantes, os grandes terratenentes ou latifundiários empregavam facilmente mão-de-obra barata e desprezada pelas autoridades, que jogava corruptamente com esta tradição de labor.
Agora os terratenentes mal empregam qualquer tipo de mão-de-obra, porque ninguém quer trabalhar. Agora, os preços dos alimentos por todo o Brasil, com especial repercussão no Rio de Janeiro, aumentam a cada mês, e um dia em que essa maminha gordinha e redondinha que é o Estado secar, o Nordeste ainda vai ter mais dificuldades, porque os grandes empresários já terão, por essa altura, investido as suas poupanças noutros sítios. Sim, porque o estado dá e tira. Isso determinará o fim do mercado agrícola que enriquece as cidades de Pernambuco e Baía e Recife, que terão de viver do pululante turismo sexual que se faz naquela zona. Estas são as consequências de um Estado que, em vez de abrir as economias das regiões e esforçar os seus meios na defesa das liberdades do cidadão, se limita a distribuir "equitativamente" recursos, algo que é muito fácil, é como disfarçar a ferida com, vá lá, cosméticos. Cosméticos capazes de também caçar votos.

Outros problemas da recondução Estadual podem ser vistos por aí fora, no mundo. De facto, o Estado não só contribui para a obesidade do cidadão, como também lhe acabará por programar um "reduce fat fast". De facto, comida está mais cara, não é? Vejam lá o vídeo e depois prossigam.

Nos EUA, o candidato presidencial que planeava a política social que entrou em grande voga e mediatismo está agora a atrasar-se nas sondagens.
De facto, um sistema de duas rondas tem destas coisas, os cidadãos começam a pensar melhor se querem um presidente que não só vai criar mecanismos de saúde mais flexíveis, mas que pensa em criar outros sistemas de subsídio estadual que serão o problema de outros presidentes no futuro, e que vai obrigar a classe média americana a pagar a vida de outras pessoas, contribuindo assim para a dead end que é a actual Segurança Social Europeia.
Infelizmente a alternativa a Obama é, nas palavras de Stiglitz, o representante de um velho corporativismo em trajes novos.

Em Portugal, o RSI aumenta 427% em relação aos números de 2004, mantendo-se Portugal com os piores índices de pobreza na União Europeia.
União Europeia que acordou para os problemas das políticas passadas.
A Suécia acordou para os malefícios da política social até aí seguidos, e já mudou o Executivo social-democrata para um executivo de Direita.
A restante Escandinávia fez ou está em vias de fazer o mesmo mesmo.

De facto, todos este "limousine-liberals" têm meios complexos de ver o actual estado de Portugal. O que não é muito difícil, pois está riscado de estradas vazias e desnecessárias, temos actualmente a rede de estradas mais prolífica da Europa, o que seria bom caso o país não fosse tão pequenino, e temos uma educação que custa os olhos da cara ao Estado, e que não apresenta o mínimo de resultados.
Faz-nos pensar se seremos todos assim tão libertários ou anarco-capitalistas, ou apenas liberais à moda antiga.

sábado, 23 de agosto de 2008

Liberdade e Mercado - Rodrigo Adão Fonseca

Um liberalismo bem estruturado não sacraliza imediatamente o mercado: o mercado é, do ponto de vista liberal, uma construção mediata, uma consequência objectiva daquilo que é a sua componente subjectiva, ou essência, daquilo que lhe é prévio: a tradição liberal preocupa-se, sim, com a pessoa e com a protecção da sua esfera de vontade, do seu exercício de liberdade e arbítrio. O “mercado” mais não é do que uma sobreposição de espaços difusos, onde os cidadãos/pessoas/indivíduos/agentes (ou como lhe quiserem chamar) projectam as suas escolhas, mais ou menos livres, mais ou menos informadas, mais ou menos medidas, mais ou menos racionais, mas sobretudo, onde realizam os seus anseios, e onde, obviamente, recolhem - ou antes, deveriam recolher - os benefícios, ou sofrem - ou antes, deveriam sofrer - as consequências dos seus actos e decisões. Os mercados são, nesta perspectiva processualista, neutros, porquanto não têm capacidade volitiva própria; os mercados amplificam apenas os ecos de milhões de actos e decisões individuais.

Mas, afinal, os que tanto criticam a actuação livre nos mercados, o que têm em mente? Obviamente, uma outra forma de mediar as relações entre os cidadãos/pessoas/indivíduos/agentes, ou como quiserem chamar-lhes. Limitando, ou até agregando, a tutela do arbítrio. Retirando ao máximo a subjectividade do processo de decisão.

Não sejamos, porém, ingénuos. Se os mercados por vezes projectam decisões que penalizam cirunstancialmente uma boa parte dos seus agentes, será que o cidadão comum ficará mais protegido pela limitação/supressão do arbítrio individual, transferindo-o/agregando-o em decisores tipicamente estatais, os tais que optarão por nós, “para o nosso bem”? Miguel Portas, esta semana, na Visão, dizia que continua “(…) a pensar que é possível ao Homem construir uma sociedade de abundância, em que o Estado seja dispensável e em que a sociedade seja capaz de se organizar e de se auto-administrar, distribuindo essa abundância de forma igualitária, para que cada um possa seguir os seus caminhos sem atropelar o próximo (…) é possível um outro mundo assente, não na propriedade, ou no que se tem, mas no que se pode ser (…)”. Será que a generalidade dos cidadãos comungam desta forma de estar, desta crença numa sociedade pós-materialista, será que estão dispostos a alienar a sua liberdade individual, o seu arbítrio, ainda que possa por vezes este acarretar consequências negativas, para se entregar na busca desta sociedade “auto-organizada” e “auto-administrada”, paradoxalmente pretensamente abundante, na ausência de propriedade?

As sociedades mais livres são aquelas que, ao longo da História, têm conseguido, em substância, na escassez - que não é um dado extrínseco, mas um estado intrínseco ao homem, resulta da sua própria natureza uma permanente insatisfação (e que a Utopia de Miguel Portas ignora) - produzir abundância, as sociedades bem sucedidas são as que correm riscos, as que libertam os cidadãos, as que dispensam as mediações, e promovem a regulação como ideia subsidiária. São as que apostam nos cidadãos, e potenciam a sua capacidade criativa e de decisão. O que nós precisamos é de cidadãos mais preparados, mais activos, mais capazes, mais inventivos, mais autónomos, que saibam governar-se, enfim, substancialmente mais livres, precisamos sobretudo de melhorar a nossa subjectividade para nos afirmarmos num mundo cada vez mais aberto e, por isso, mais competitivo, e não avançar para soluções que objetivem a pessoa, desperdiçando e concentrando as suas capacidades em entes colectivos, necessariamente aprisionáveis, necessariamente vulneráveis à captura dos que perseguem Utopias que desprezam os valores do cidadão comum.

Prefiro existir num “mundo imperfeito”, que valorize a subjectividade, o risco, a incerteza, os valores do trabalho e do mérito, a inovação, e acarrete a penalização do fracasso, ainda que tenha, por viver em sociedade e na relação com os outros, que sofrer as consequências de fracassos que não são os meus, do que perseguir, subjugado, o “Paraíso na Terra”, e alienar-me, na crença de uma pretensa abundância igualitária.


esta foi direitinha para a secção de livres leituras...

uma rapariga de doze anos levar-nos-á à revolução

O Mundo só vai melhorar quando pararmos de olhar para os desprivilegiados como posters.

Como fardos somente sustentados pela nossa caridade.

Quando começarmos a olhar as pessoas como se fossem pessoas, e a dar-lhes responsabilidades que exigimos aos restantes adultos.

Quando nos atrevermos a olhar para além da estatística.


Ver o site:
The Girl Effect
para mais informações.

quarta-feira, 20 de agosto de 2008

os números do RSI - autora convidada

"É patente que os beneficiários do RSI têm vindo a aumentar consideravelmente, podendo apontar-se a causa para a actual crise económica, que indubitavelmente tem-se reflectido numa alta de preços crescente, situação à qual nem todos reúnem “instrumentos” necessários para subsistir sem o apoio social. A atribuição do RSI é, ou pelo menos deveria de ser presidida por um plano de reinserção social, cujo principal objectivo é possibilitar o acompanhamento do beneficiário rumo ao seu ingresso no mercado de trabalho, de modo a encurtar o quanto possível a sua situação de dependente do rendimento social de inserção. É notório que a execução destes planos de reinserção ficam muito aquém do desejável, mostra-o os cerca de 312 mil beneficiários registados em Dezembro de 2007, aos quais se juntaram na primeira metade deste ano mais 23 mil, que tornam os números ascendentes num curto espaço de tempo.

De facto a lógica do RSI está desvirtuada. É necessário proceder a um rigoroso levantamento das lacunas que inviabilizam os projectos de reinserção, atentando eu que não será difícil. Qualquer um reconhecerá como situação inexequível, o caso de uma assistente social com cerca de 200 processos de utentes, realizar um trabalho frutífero no que toca aos planos de reinserção do RSI. E nesta lógica atrevo-me a enumerar um dos males.

Voltando aos números do RSI, estes agravam-se ao ter em conta que deles fazem parte uma quantidade inconcebível de jovens e, quando digo jovens, não só me refiro às idades compreendidas entre os 18 e os 25 anos (período em que deveriam apostar fortemente na carreira profissional), mas como também aos inúmeros casos de menoridade.

As facilidades inerentes à aquisição do RSI, bem como em mantê-lo ao longo dos anos tornou-se numa não procura por alternativas por parte das classes mais desfavorecidas. Afinal, quando nos concedem um salário quase como oferenda a alternativa já foi encontrada à muito! Repito que o panorama toma proporções avassaladoras quando falamos em jovens menores que se deitam nos panos quentes do RSI, caso cujos planos de reinserção se tornam insuficientes para reverter tais situações num futuro a longo prazo.

É necessário rever o modo como a politica social do RSI está a ser empregue e se os objectivos que lhes são subjacentes estão a ser concretizáveis, de outra forma estar-se-á a hipotecar não só os contribuintes, bem como a autonomia dos próprios beneficiários.

A assistência não está em dar esmole indiscriminadamente!"

Vânia Patrícia Almeida Oliveira, também publicado no Entrelinhas.

domingo, 17 de agosto de 2008

humor perigoso - a opinião de um mestre

O Risco como facto de aceitação.

The humor that makes me laugh hardest is the material I know would offend or insult someone else. Apparently I am not alone in this view because my entire career is based on that universal law. The Dilbert comics that work best are the ones you can imagine your boss or coworker looking at and saying, "Uh-oh. I think that's me."

But offending isn't enough. The audience gets more out of humor if the messenger is putting himself in danger. When Dilbert first launched, I was still working my day job. Readers loved knowing that I was on the verge of getting fired every day. The order to fire me was actually given at one point, but in the end my employer decided to give me hopeless assignments and wait for me to quit. They figured it would look better.

Dilbert is still a dangerous job. This week I got a bunch of angry letters because of a comic where Alice says she realized her job was like a dung beetle trying to mate with an epileptic cow. I think I was added to a few extra death lists. If you laughed at that comic, it's probably at least partly because you knew I was taking a risk in creating it.

ver o resto aqui, no Scott Adams Blog

porto blue jazz

Há noites que começam muito bem. Já tinha conhecimento que a Porto Lazer estava a cultivar os habitantes da Invicta com boa música, e após perder os concertos de Herbie Hancok e Mário Laginha (que parece que brilhou na sua noite), resolvi ser um cidadão digno e ir ver o que se passava nos jardins do Palácio de Cristal.
E comigo, foram as minhas cidadãs favoritas, a minha mãe e a minha irmã, que dançou comigo após alguma insistência minha.
Começou levemente, com um solo de sousaphone (desconhecia o que era um sousaphone) de Sérgio Carolino, e depois entrou o saxofone de Mário Marques, a dar o mote para Rúben Santos deslumbrar no trombone.
Foi o caraças para anotar os nomes, mas valeu a pena.
Na bateria estava um senhor que, bem me parecia tê-lo visto antes, mais não era que o baterista Michael Lauren.
The Postcard Brass Band.
E depois? Depois... depois foi Jazz, Blues, uma variada mistura de influências, muitas reminiscências de épocas passadas, autores famosos, filmes vistos, obras contempladas.
Hoje diverti-me.

Pontuação final: 7/10. Comentário: next time, i'll pay to see this guys.

PS: Alguém se lembra daquele grande filme, o Swing Kids? Não me parei de lembrar deles durante o show... Eu devia ter nascido nesses tempos.

domingo, 3 de agosto de 2008

crónica do reino dos algarves (causas da queda desta província)

Depois de 15 dias de descanso nas praias da cidade de Albufeira, 15 dias de inutilidade, votadas ao descanso, à leitura, aos gelados e aos franguinhos da Guia, estou de volta ao meu caos familiar.
Não trago fotografias nem grandes lembranças. Fui acompanhar a minha mãe e irmãos numas férias bem merecidas, depois de um ano difícil mas bem vencido.
De facto, não aprecio muito o Algarve enquanto destino de turismo de praia. O Algarve é um sítio belíssimo, fantástico, se fugirem das praias.
Aconselho a todos uma visita a Silves, cujas muralhas guardaram, em tempos, uma das últimas grandes cidades islâmicas na Europa, do ponto de vista cultural e social e económico. Eu próprio já lá fui umas 2 vezes, e sempre encontrei coisas novas. Faro é uma cidade muito bonita também, onde se come bestialmente, se soubermos procurar e aguentar a morrinhice dos algarvios, os piores serventes de mesa à face da Terra.
Sagres é um grande montão de calhaus, e por muito que procurem a escola do Infante, o mais provável é ficarem com a sensação que aquilo não é porra nenhuma, e não passa de um pseudo-esquema para atrair turistas desejosos de uma mística de um Império que nunca existiu.
Castro-Marim, Vila Real de Sto. António, a própria Albufeira, a belíssima serra algarvia, se conseguirem ficar lá hospedados um dia para apreciar a flora única, são locais de visita obrigatórios e esquecidos do Algarve. Mas isso não vem nos panfletos.
De facto, o turismo do Algarve é uma valente merda.
Por muito que se tenha lutado contra os abusos descontrolados da urbanização descontrolada, o Algarve continua a perder a corrida contra a descaracterização cultural.
Depois de se tornar o pousio para a classe média baixa do norte da Europa, o Algarve procura elitizar-se antes de ficar com o nome manchado com o rótulo de destino turístico barato.
O Algarve sofre por estar cheio de algarvios, e esses algarvios não têm poder nenhum sobre a sua terra.
Tornou-se o Algarve numa espécie de Egipto dos tempos romanos, uma região portuguesa especialmente cuidada e tratada pelos Governos centrais. As cenas do Allgarve e todos os abusos consequentes vêm daí. O poder local, subserviente e dependente, é formado por uma classe de filhinhos da putinha, gente muito rasca, fruto de cruzamentos incessantes entre a população, mantendo aquela insuspeição mourisca e uma certa anti-portuguesice.
Esse poder local, que precisa de Lisboa, porque aprendeu, aquando da última crise económica que varreu o Algarve, que precisa de Lisboa para chamar os portugueses para o esforço patriótico de encher o hotéis e pensões algarvias, surpreendentemente abandonadas pelos cidadãos ingleses e alemães, fartos das crónicas subidas de preço. Agora, que tudo voltou ao normal, o Algarve já retomou o caminho, pensa-se.
Eu penso que não.
Se querem ser servidos rapidamente num restaurante, na área de Faro a Albufeira, procurem um restaurante brasileiro, chinês, ou cujos funcionários sejam morenos o suficiente para se ter a certeza que não são portugueses do Algarve. O único algarvio simpático, alegre, competente tanto na cozinha como na arte de bem receber, era um que havia nascido em Trás-os Montes.
A polícia algarvia é constituída por dois tipos de homens. O primeiro, homenzinhos pequeninos com barretes da GNR, serve para pedir indicações caso precisem saber onde é a praia. Caso queiram saber onde fica a rua onde se vende bugigangas para comprar para toda a gente lá em casa, eles já não conseguem. Não lhes pagam para isso, peço muita desculpa.
O outro tipo é formado por gorilas de boina, que vestem de fato-macaco preto, cuja única função é andar de um lado para o outro a falar numa língua desconhecida (o algarvio é, de facto, um dialecto) e que servem para nos escondermos atrás deles quando um inglês nos ameaçar com uma garrafa quebrada.
O comércio algarvio é em tudo igual ao do restante país, excepto na proporção. De facto, a qualidade dos produtos é duas vezes pior, e duas vezes mais caro. Abundam os senhores das tatuagens temporárias, os marroquinos dos bonecos luminosos, com cenas de néon na boca que os fazem parecer retardados a mastigar pirilampos, as pretinhas das tranças, adoro essas pretinhas, levaram-me 10 euros por uma merdice que puseram no cabelo da minha irmã, que eu próprio voltei a pôr quando aquilo se descolou. Há também os pretões dos óculos, senegaleses fundamentalistas, sendo que um deles chegou a amaldiçoar-me quando eu o mandei dar uma volta, irritado de negar a décima tentativa de negócio. A dada altura, oferecia-me a irmã e 30 camelos, se eu aceitasse comprar um par de óculos por 10 euros. Recusei, obviamente, por os óculos serem feios e por não ter espaço para pôr 30 camelos.

No centro de Albufeira, um senhor muito barbudo (estilo Karl Marx), apresentava num pequeno pavilhão patrocinado pela Câmara de Albufeira, com uma mensagem a dizer qualquer coisa contra a globalização (aquelas frases feitas) num painel de cartão forrado a latas de refrigerantes.
Como eu estava há vários dias sem discutir com o Francisco Noronha e a Daniela Ramalho, pessoas a quem eu gosto de chatear como o caralho, resolvi soltar umas boquinhas àquele Pai Natal dos sovietes.
"É a Globalização que lhe permite comprar todas essa latas de refrigerante" disse eu, e pensei, "fodi-o".
"Não, é a Globalização que me obriga a comprá-las" e pronto, agora fica tudo a pensar que o velhinho me encurralou. Eu acho simplesmente que o ancião podia muito bem ter comprado uma água Luso, em vez de gastar o dinheiro da Câmara para comprar Coca-Colas e Fantas. E depois, ainda fiquei arrependido de não lhe perguntar se não era a globalização que trazia todos aqueles turistas à sua cidade que lhe compravam todas aquelas pulseirinhas capitalistas que ele vendia à má rês a par da exposição. Pior, ainda foi o homem que me disse "Sabe ao certo o que é a globalização? Sabe o que é concretamente? É as empresas virem pra cá, comprarem tudo, e depois despedirem toda a gente".

É que o Algarve não sofre apenas de políticas governamentais estúpidas, de autarcas idiotas, de um turismo burro e dos turistas idiotas. O Algarve agora tem manifs anti-globalização.

domingo, 20 de julho de 2008

vós sem mim (durante 15 dias)

desejo-vos a todos um belíssimo verão.
muito cuidado com as alforrecas nas praias.

quem sabe vamos todos ver um bom concerto, hein? tipo este


quem for ao sudoeste mande-me um toque...

sexta-feira, 11 de julho de 2008

finding roy orbison

Caminho ofegante pelas estreitas ruas de uma aldeola no Mali. No centro do pequeno povoado, está um enorme pinheiro manso, que contrasta coma desolação desértica do local. Todas as pessoas estão pintadas de vermelho na cara e nos polegares, e insistem em mostrar-mos. Estarão a incitar-me a trepar à árvore? Tomo-o como um sim, e começo a fazê-lo. Mal ponho a mão no primeiro ramo, solta-se da frondosa folhagem uma enorme multidão de escorpiões. Estes têm as suas pequenas pinças avermelhadas, e começam então a pintar-me a cara e os polegares. Marge aparece e começa a repetir a palavra "écloga" até desmaiar.

"Acordo sempre sobressaltado deste sonho", pensei. "Talvez deva começar a pensar em não trepar a árvore, já não durmo decentemente à 15 dias."
Preparei-me com aprumo, um bom rapaz quando sai à rua deve mostrar sempre um ar de graça. Penteei-me com os dedos, vesti o casaco menos velho, e parti para a reunião com o editor.
Levava o manuscrito debaixo do braço, e tentava aquecer-me com um pequeno cachecol. Se algum dia forem a Berlim, não se impressionem das semelhanças da palavra Bär (urso em Alemão) e Berlin. Os próprios cidadãos acham que a sua cidade era dantes um ponto de encontro de ursos. De facto, para suportar o frio berlinense, uma camada extra de pêlo e gordura ajudariam muito.
O editor estava num café com esplanada à beira da Unden Der Linden, que até à uns anos era um local florido, até Hitler ter cortado todo o tipo de flora para o seu povo poder ver os seus tanques de guerra desfilar.
- Saudações, Herr Klein! (Herr Klein era, de facto, muito pequeno)
- Saudações! Ligou-me a querer ver-me meu amigo.
- Tenho um trabalho novo, vai permitir-nos saldar todas as dívidas e pagar a renda.
- Diga meu caro, bitte!
- É algo totalmente novo, que vai fazer com que a Teoria Pura do Direito de Kelsen pareça um hit de Verão!
- Eu editei Kelsen. De facto, foi um sucesso estrondoso, não se via casal ou família que não andasse com ele debaixo do braço. Ganhou muito dinheiro, e nunca mais o vi. Entregou-se à má vida. Tu sabes, dinheiro, mulheres, noites, drogas. Acho que em Viena ninguém o parou. Ouvi até dizer que tinha feito uma Constituição aos austríacos. Um homem não pode descer mais baixo que isso para ganhar uns trocos. Os austríacos... enfim, depois disso foi o fim. Deambula pelas ruas de Munique a pedir esmola, faz uns trabalhecos em troca de comida e vinho. Não queiras ir pelo caminho da fama de Kelsen rapaz, o fim é sempre o mesmo. A estalagem. Ou a farmácia. Ou o prostíbulo. Ou o exército. A frente na Rússia pede mais homens aparentemente.
- Isto é algo superior. Eu bem me lembro de ver o meu pai a recitar longas passagens da Teoria Pura do Direito diante da minha família. O idiota do meu tio detestava. A beleza do capítulo sobre as fontes do Direito... A Lei, a Lei! Toda aquela pancada naqueles mariquinhas dos jusnaturalistas. Um pródiga pândega. Mas isto é mais, meu caro, é mais!
- De que trata, meu jovem?
- Descobri.
- Descobriste o quê?
- Ele, já sei onde Ele está.
- Ele? quem é ele?
- Ele com o maiúsculo...
- Deus? o que queres dizer com isso?
- Schiu Herr Klein, ninguém deve saber disto...
- Desculpa meu caro... mas... Nietzsche não o matou? Todos sabem disso...
- Tenho provas que é mentira. E sei finalmente porque o fez.
Herr levou-me para o escritório. Com tantos Gestapo disfarçados de garçons em Berlim por essa altura, de repente pareceu-me má ideia ter saído de Paris após a invasão nazi e ter feito o percurso inverso dos restantes intelectuais. No entanto, na altura pareceu-me muito lógico ir para a capital do III Reich, o único sítio em toda a Europa Ocidental que não possuía um militar alemão munido de uma SturmGewehr pronta a nos abrir um orifício extra ao dobrar da esquina.
Expliquei então a Herr Klein todo a minha inicial pesquisa. De facto, o filósofo oficial do regime não tinha assassinado Deus, como todos pensávamos. O grande busílis desta questão é simples. Porque razão o filósofo matou o Criador? Após várias pesquisas, encontrei uma razão possível. Deus tinha dormido com a mulher de Nietzsche, o que é uma muito natural, dada a apetência natural do Criador para possuir virgens casadas (sabia-se que Nietzsche nunca tinha consumido o seu casamento, visto que se achava demasiado perfeito para a sua própria mulher).
- Queres dizer que... Aquele que dá significado à existência ainda está vivo?
- Sim, mas Hitler não pode saber... ou acaba o trabalho.
- Mas como Nietzsche não o apanhou?
- Deus gosta muito de bricabraque, fazer arcas e coisas dessas. No entanto, é extremamente impaciente, e faz a maioria do seu trabalho às escuras. Só depois de criado o Universo ele disse " Faça-se Luz!" como está escrito no Génesis. O mais provável é Nietzsche ter usado a ajuda de outro inimigo de Deus, um empirista qualquer, e lhe tenha batido com uma tabula rasa.
- Como escapou ele?
- Com a ajuda de Karl Popper. Ele simplesmente falsificou todas as provas da sua sobrevivência. Deus está, neste momento, escondido no Vaticano.
Nesse momento, Herr Klein estacou e fitou-me serenamente. Tinha uma arma na mão. Disse-me:
- Finalmente alguns resultados. Fizeste muito pelo regime meu amigo. Está na hora de seres recompensado.
- Herr Klein.. era o senhor o empirista desconhecido! Mas como?
- Eu era jovem... Carl Schmitt era mais velho e mais bonito. Eu sentia-me atraído por ele, era uma relação imprópria para a nossa sociedade, mas ele era o meu professor e eu o seu embevecido aluno. Quando os nazis fizeram o que lhe fizeram... a sua obra, usada para os piores fins... Eu já não acreditava em nada. Por isso, ajudei-os.
- Não há mesmo chance Herr Klein? Não há perdão?
- O mundo continua vazio e merdoso, haja Deus ou não. Para ti, Herr, não há perdão.
Soou em disparo. Fechei os olhos, encomendando a minha alma Àquele que afinal ainda vivia... Quando os abri, deparei-me com uma cena estranha. Vários homens de púrpura estavam de volta do corpo de Herr Klein, tinham arrombado a porta.
De entre eles, sobressaia um que usava um alto chapéu.
- Sabes quem eu sou, paisano? - pergunta-me o homem do chapéu, com um temível sotaque siciliano.
- Vossa Eminência... sois aquele a quem chamam o Papa...
- É verdade. Johny boy, não vais chibar aos chuis o que acabaste ver, capisce?
- Sim...
- De facto, nada disto é pessoal. Nada disto deve ser pessoal. É tudo uma questão de negócios, o Padrinho lá em Cima tinha uma dívida a saldar com este traste.

Foram embora pesadamente, levando o pequeno corpo de Herr Klein escondido na minúscula arca frigorífico, para o qual foi dobrado em 5 partes iguais de forma a caber lá. Quando iam a sair, perguntei ao boss:
- Papa... poderá haver perdão, agora que Ele cá está?
- Há sempre um perdão filho. Só precisas procurar por ele em ti próprio, e deixar que os outros o façam. Bona Sera.
- Bona Sera...
Desci calmamente os degraus do prédio onde há pouco estava o escritório de Herr Klein. Estava claramente na altura de seguir para uma cidade mais livre. Talvez Estalinegrado, Petrogrado ou mesmo Moscovo.
Comia distraidamente um apfell strudel enquanto seguir pela Unden Der Linden...

terça-feira, 24 de junho de 2008

o derradeiro boneco


o Boneco Jesus (acoselho-vos a entrar no site e a ver a descrição desta preciosa peça, em tudo semelhante ao nosso Salvador, especialmente pelo facto de lhe faltar, como é natural, qualquer tipo de traço racial semítico, Graças a Deus)

o inimigo público

"FEMINISTAS MODERNAS VÃO QUEIMAR IMPLANTES DE SILICONE NA GULBENKIAN

De 26 a 28 de Junho vai realizar-se um Congresso Feminista na Fundação Calouste Gulbenkian, organizado pela União de Mulheres Alternativa e Resposta (UMAR), cujas organizadoras prometem não queimar soutiens, para contrariar o estereótipo. “Nõs somos mulheres modernas. Vamos destruir o novo símbolo da sujeição da mulher à vontade masculina: os implantes de silicone. Mas, como eles são resistentes ao calor, vamos explodir duas tetas falsas, como os taliban fizeram aos dois budas de Bamyan”, explicou Maria Teresa Horta, uma das feministas envolvidas no congresso. “E aconselhamos vivamente todas as mulheres a verem o filme O Sexo e a Cidade e a não comerem pipocas no cinema, mas testículos de porco salteados, como forma de mostrar o desprezo pela pseudo-superioridade masculina”, concluiu. VE [Vítor Elias]" in Inimigo Público

o que eu não teria dado para ter sido eu a escrever isto. Estou a pensar seriamente desistir de Direito para escrever para o Inimigo Público.

Ver o resto da discussão à volta deste artigo aqui

domingo, 22 de junho de 2008

consolatio

André Vasques

finge que não me vês
passa por mim
através de mim,
e não partilhes uma única palavra.

diz em bom português,
sê meiga, assim
sê gentil, por fim
mostra-me uma janela que não abra.

meu afecto,
minha modéstia,
meu discurso,
minha alma.


leva e vende-a rapidinho.
não me deixes mais a cozinhar
não me deixes em sossego mesquinho

não me fales punhais, sem levar pelo menos um
guardado nos lábios.

terça-feira, 10 de junho de 2008

Viva La Revolución!

Ao meu irmão Pedro, na Argentina,

Camarada Pedro, ganhámos! A Capital de Cristóvia é nossa!
Após meses nas nas montanhas de Havara, a passar todo o tipo de privações, a um passo da sodomia masculina colectiva, os defensores do socialismo-marxista venceram a luta! Hasta La Victoria, Sempre!
Os últimos 4 anos foram terríveis. Ainda me lembro de quando éramos um bando de adolescentes introvertidos, mas que ainda assim se conseguiram organizar à volta do estandarte do comunismo, e protestar contra a Ditadura de Batistério Fulgaz. O nosso líder, o brilhante orador José Pablo, entusiasmou-nos com o seu discurso revolucionário, e cedo organizamos um partido, que foi logo reprimido pelos órgãos ditatoriais. Mais uma vez, as palavras inspiradas do nosso camarada Pablo iluminaram os nossos corações, e decidimos partir para o exílio. E assim foi que 50 jovens universitários partiram para a selva, decididos a lutar contra o regime armados com a palavra do comunismo, e assim foi que nos equipámos apenas com algumas roupas e levando cada um o Livro Vermelho de Mao e o Manifesto Comunista do camarada Marx.
Infelizmente, de pouco nos valeram as palavras de alento do Camarada Pablo, pois ao fim de 4 meses na selva tropical, e sem qualquer tipo de preparação militar ou de sobrevivência, e visto que a maior parte dos membros do Partido Comunista para a Libertação de Cristóvia era asmática, éramos já apenas 40, e estávamos a ficar sem mantimentos após termos devorado em conjunto o último Manifesto. Fiquei desde aí com o cargo de Provedor-Geral da Revolução Cristóvana, e tal cargo me fez muito orgulhoso durante várias semanas, até ter descoberto que era apenas o cozinheiro do grupo.

Como a situação se tornava gradualmente insustentável, e os homens lidavam agora com o grupo de mercenários contratados pela CIA, que havia negociado com Batistério Fulgaz a nossa aniquilação em troca da cedência aos EUA do monopólio sobre os sumos de laranja, resolvemos entregar-nos ao inimigo.
Qual não foi o meu espanto quando a Guardia nos disse, após nos interrogarem com a ajuda de cilícios e cnutes, que o Ditador Fulgaz nos queria ver. Conduziram-nos aos pontapés por toda La Villa Nueva até à sede do Partido Único, que também era o Palácio do Governo de Cristóvia, casa de Fulgaz e dos seus 13 irmãos, 2 esposas e 26 concubinas. O Ministério da Educação, o edifício coberto por ouro maciço ao lado do Palácio do Governo, era o lar dos seus 60 filhos.
Enquanto nos sentenciava uma leve pena de 145 anos de prisão, e pena de morte por esfolamento ao nosso líder Pablo, reparei que ainda tinha no meu bolso, que não tinha sido revistado pela Guardia visto que estes apenas tinham descoberto no nosso arsenal 3 fisgas em más condições e uma raquete e achava que éramos um bando de desprezíveis ratos, uma pequena granada-de-bolso soviética. Pertencera a um carregamento que os camaradas sovietes nos tinham enviado, mas que viera em tão mau estado que causara a morte a 6 camaradas quando estes se lembraram de abrir as caixas de munições para as AK-47. E assim, sem pensar duas vezes, atirei a granada para cima da secretária de Fulgaz, e esperei pelo resultado. O Ditador, desesperado, resolve atirá-la para o outro quarto, onde os seus sobrinhos faziam uma rave party com vodka altamente alcoolizado.
Metade do Palácio explodiu. No rebuliço, o Ditador Fulgaz ordenou o ataque das suas tropas, mas com a confusão estas ouviram as coordenadas erradas e atacaram o acampamento dos mercenários da CIA, fazendo-os desistir. Os Generais decidiram assassinar Fulgaz devido ao facto de estes ainda não os ter promovido a Generalíssimos, e entraram em conflito imediato com o patronato, que fabricava as armas do exército.
Em duas semanas, a oposição capitalista tinha-se aniquilado, tal como dizia o Manifesto do Camarada Marx. Encontrei o nosso amado líder agachado atrás de um balcão de mercearia, numa inteligente política de "aguardo pelo decorrer da situação". Quando as coisas se acalmaram, levei-o a tremelicar pela rua cheia de buracos das bombas até ao Palácio do Governo e "sentei-o no poder", à espera das suas ordens para o início do regime marxista-leninista.
Como estava lívido e altivo o nosso Mestre! Com a sua sábia mão, acalmou os nossos espíritos, e disse: "O Povo ainda não está preparado para os benefícios do marxismo-leninismo. Ele deverá aguardar!" E depois disso, autoproclamou-se Monarca Absoluto da Ilha.
Eu ainda sou o Provedor-Geral da Revolução! Junta-te a nós meu irmão, vamos apoiar o Movimento de Monarquia Absoluta Provisória enquanto não chega a Primavera Socialista!

Hasta La Victoria!

domingo, 1 de junho de 2008

amo-te woody

Aconteceu uns 10 dias após a publicação do meu artigo sobre a possibilidade de Jesus Cristo ter sido uma mulher que recebi aquela chamada. A princípio pensei que era mais uma ameaça de morte, e preparei-me para desligar.
Do outro lado falavam-me em francês, e foi muito estranho, pois estávamos em Paris.
Perguntou-me se podia falar comigo, era uma voz de mulher. Eu perguntei-lhe quem ela era, e ela disse-me que tal relação se relaciona consigo mesma e tem de ser constituída a si própria. Eu compreendi logicamente que ela estava a citar Kirkegaard, e combinei encontrar-me com ela no "DuBois de Paris", algures em Paris. Nessa altura estava com a renda atrasada em quase dois meses, e com a guerra prestes a assolar a Europa, isso era considerado algo sobejamente negativo. Tinha negociado com o senhorio pagar a a minha renda com textos meus, que ele poderia editar em qualquer jornal da cidade como sendo dele. Acabou por não me dar nenhuma resposta em concreto, além de me ter partido o nariz em 3 sítios diferentes nesse exacto instante, por isso fiquei à espera da sua anuência.
Como em todos os meus encontros com mulheres, levava comigo um livro de Dostoievski, na esperança de conseguir o mítico sexo fácil que o autor proporcionou a todos os intelectuais do mundo.
Ela estava sentada na esplanada, bebericando uma cerveja alemã, magra e cabelo curto, (ela, não a cerveja) muito branca e usando um vestido negro comprido (isto sim, a cerveja). "Olá. podemos realmente conhecer o significado da vida?" era uma pergunta exasperante. "Relaxa miúda" Já é tão difícil perceber o que o Siza Vieira fez na baixa do Porto, quanto mais toda uma pergunta universal? Pedi-lhe para ir mais devagar comigo, e ela resolveu mostrar-me um seio, o que teria sido agradável não estivéssemos nós numa cidade prestes a ser invadida pelo exército nazi.
"Que merda é esta? Se eu soubesse que tinha sido para isto que me tinham convidado, teria ficado em casa"
- E que farias tu em casa? Mais alguma teoria? Mais alguma mentira?
- A que te referes?
- Tu sabes. A tua teoria.O envolvimento do banco federal na morte de Deus. A relação impetuosa de David Hume com o seu guarda-chuva, e todo relativismo daí associado. O meu nome é Marguerite.
Não podia acreditar no que ouvia. Ela falava sobre trabalhos que eu não tinha ainda publicado. Perguntei-lhe o que ela queria de mim, e se me podia pagar o café, visto que o empregado estava especado desde o início da conversa à espera que nós fizéssemos o nosso pedido.
"Quero que partas para África comigo" as raparigas de Paris são sempre as que tem mais sardas, e isso dá-lhes um poder perceptivo inimaginável.
"Eu sou só um rapaz de Direita português," disse-lhe, "o máximo que posso fazer é cantar uns faditos e discutir Kafka". E ela esbofeteou-me depois de eu mencionar Kafka, escondendo finalmente o seio. Tomei aquilo com um sinal, e fui com ela para África. Aterrámos em Timbuctu, também conhecida por Vila Pouca de Aguiar, e dormimos juntos lá. Durante três semanas viajámos numa característica caravana de comerciantes tunisinos, e durante esse tempo eu tocava todos os dias na minha guitarra, para os homens que viajavam connosco uma cantiga que havia aprendido nos meus tempos de amores de estudante, chamada Amores de Estudante, até que chegando ao fim das três semanas os tunisinos cansaram-se e levaram-me atrás de uma tenda e tentaram fazer-me engolir a viola, enquanto juravam que até à 6º geração não voltariam a ouvir fados estudantis. Felizmente fui salvo por uma tempestade de areia que causou 7 baixas, duas delas sendo camelos.
"A realidade têm necessidade de essência, sendo que esta é um pouco mais pequena que a que Hobbes descreveu" disse-me ela.
- Que se foda isso, Marge, as pessoas estão a morrer, porque me levaste para aqui?
- Eu tenho de saber...
- Hobbes era um idiota, que ficou depressivo quando descobriu que não era São Lucas.
- Mas se Descartes diz que"penso logo existo" e isto não passa de...
-Sim, tal como disse Allen, não passa de um aforismo para "Eh! Vem aí a Edna com um saxofone", mas tudo isto está a ficar muito semelhante ao livro dele!
Marguerite desistiu de tudo nesse instante. Fugiu do acampamento e refugiou-se algures em Cáceres, Estremadura Espanhola. Eu apanhei o avião mais rápido para sair daquele local, e esse desespero saiu-me caro. Esqueci-me de averiguar sobe o verdadeiro paradeiro de Marguerite, e o primeiro avião que saia de Timbuctu era curiosamente um que fazia escala em Nova Gales do Sul, Austrália.
Quis dizer-lhe que o ser (Ser) independente de definições teleológicas de existir (Existir) estava separado dessa necessidade (Necessidade), que tal relação (Relação) não se auto-constrói, exige tempo (Tempo) e quem sabe tomates (Tomates). Mas ela fugiu.
Mais tarde descobri que se tinha reservado à devassidão moral, e só acasalava com homens chamados Hernando, e morreu a dançar o fox strot durante a visita oficial do príncipe das Astúrias a um parque temático.

Fomos uma geração queimada. Marguerite morreu com pés cansados e uma dívida de 70 francos a uns tipos da FedEx por causa de um piano.Todas as noites sonho que um tigre verde, com o nome Marguerite tatuado nas espátulas, me assalta duranto o sono e devora-me os genitais, o que me estraga a noite.

segunda-feira, 26 de maio de 2008

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